Há um
axioma hoje muito válido, devido ao pensador alemão Lessing, um dos grandes
filósofos do Iluminismo que influenciou a teologia atual, onde se diz que
“nenhuma religião possui toda a verdade, só o próprio Deus, qualquer que seja o
seu nome, é a verdade” (G.Epfraim Lessing, apud H.Kung, Teologia a caminho,
pag.263). Assim por exemplo, o ser humano procura Deus como que às apalpadelas, como disse Paulo
aos atenienses (At.17,27), ou como um enigma, num espelho, 1 Cor,13,12. Nós e
também os bilhões de pessoas de todas as
religiões. Ah, mas nós temos os dogmas, e a palavra infalível de Deus. Cuidado,
é por causa dos dogmas que a Igreja se tornou excludente, o que significa que a
Igreja exclui, ou excluía um monte de gente, e hoje não exclui ninguém. No
concílio de Latrão, em 1215 foi declarado como dogma que “fora da Igreja não há
salvação”, e este dogma foi repetido no concílio de Florença cerca de 200 anos
depois, em 1447: “ A santa Igreja romana crê firmemente, confessa e prega
que ninguém fora da Igreja católica, não apenas os pagãos, mas também os
Judeus, hereges e cismáticos não poderão entrar na vida eterna. Todos vão para
o fogo eterno, preparado para o diabo e seus anjos, caso não se incorporem
antes da sua morte à Igreja” (Denzinger, Hermann, op.cit.n.1351). Veja bem
que este dogma já foi questionado no século XVI no concílio de Trento, e no
século XVII Roma condenou os Jansenistas rigoristas franceses por propagarem
este dogma; e em 1952 o Santo Ofício condenou o Capelão da Universidade de
Harvard por continuar defendendo este dogma (Cf. H.Kung,o.c.p.266). Finalmente
o concílio vaticano II considerou como nulas as declarações do concilio de
Latrão e de Florença na Constinuição
sobre a Igreja: “Todos os que buscam a Deus sinceramente, procuram cumprir a
sua vontade, conhecida por meio da consciência e agem sob o influxo íntimo da
graça podem obter a salvação” (LG.n.16). E na Declaração sobre as religiões
não cristãs: “A Igreja Católica não rejeita o que é verdadeiro e santo em
todas as religiões” (NA.n.2). Isso significa que a posição católica tradicional já não é a mesma daquelas épocas. E isto
esclarece também, como afirma o teólogo H.Kung, “que a Igreja deixou aquele
dogmatismo que se considerava de antemão na posse de toda a verdade, oferecendo
às outras religiões apenas condenações ou exigências de conversão. Agora o
desprezo das outras religiões deve ser substituído pelo apreço; a negligência
pela compreensão; o proselitismo pelo diálogo. Na verdade, durante muito tempo,
os pregadores e catequistas recebiam pedras em vez de pão” (o.c.p.217). Este
axioma antigo de que todo mundo teria que entrar na Igreja católica pra se
salvar é que gerou o jargão “fora da Igreja não há salvação”, fabricado
por São Justino no séc.II, e que foi adotado e sacramentado pela Igreja. Não
interessava em primeiro lugar a mensagem do evangelho, mas a Lei que obrigava
com penas eclesiásticas e civis todos os cidadãos. Porque o cidadão tinha dois
patrões, e duas camisas de força: a Igreja e o Império, porque agiam juntos. O
cidadão estava fritado entre a cruz e a espada, como se dizia no jargão antigo.
De um lado, a Igreja com a cruz, de outro lado, o Rei com a espada. E o
“escravo-cidadão” exprimido no meio. Durante toda a Idade Média foi esse o
regime. Foi preciso chegar o século XIX com a Declaração dos Direitos Humanos
da liberdade de consciência e de religião para mudar esta situação, e dar a
liberdade ao ser humano. Com isto, na Idade Média, havia duas espécies de
escravidão: a física e a moral. A dos corpos e das mentes. A da sujeição aos
donos de escravos, com a espada; e a sujeição aos donos da fé, com a cruz. Isto
aconteceu depois que a teologia de Tomás de Aquino firmou o axioma de que a
filosofia e a ciência eram escravas da teologia; e surgia dai a escravidão das
mentes aos donos da fé, e ao mesmo tempo se sacralizava a escravidão aos donos
dos escravos, e aos Reis. Baseado na filosofia de Aristóteles segundo o qual o
estudo não era para as classes baixas e trabalhadores, mas para os
“bem-nascidos”. Depois do Aquino veio o “Encridion ou conjunto das definições
do magistério eclesiástico publicado por Henrich Denzinger em 1854, como um
livro de Leis dogmáticas indiscutíveis. Estava sacralizada e sacramentada a
escravidão das mentes, em paralelo com a escravidão dos corpos, a escravidão da
cruz e da espada. Ah, mas a Bíblia! Ah, mas Deus falou! E o que olharam os
outros? “Na história do Cristianismo é “lícito matar crianças, queimar viúvas e
torturar hereges ate à morte? Pode-se justificar sacrifícios humanos porque são
oferecidos a um Deus? E a magia que procurava forçar a divindade, tomada como
religião?” (o.c.p. 278). O que nós criticamos noutras religiões, eles criticam
no Cristianismo. Não sem razão há muitas vezes uma crítica bem clara das
grandes religiões ao Cristianismo: “O Cristianismo parece aos olhos dos
seguidores de outras religiões frequentemente exclusivista, intolerante e
agressivo, apesar de sua ética de paz e amor. E sua aversão contra o mundo e
contra o corpo. E exagera de maneira quase doentia a consciência do pecado da
culpa do homem supostamente corrompido em seu interior” o.c.p.273. Por outro
lado, cada religioso de cada religião pensa ter a “verdade”. Porém, nenhum
problema produziu na história das Igrejas tantas contrariedades, tantos
conflitos sangrentos e até tantas “guerras santas” como o problema da
“verdade”. Em todos os tempos e em todas as religiões o fanatismo cego pela
verdade atormentou, matou, queimou, destruiu, e assassinou impiedosamente. Nesta
busca da verdade sempre tem que entrar a religião. Porém, todo mundo esquece
que, como dizíamos, no céu não haverá religião nenhuma, só a do amor. Na verdade “uma religião é
verdadeira e boa na medida em que é humana, e não oprime nem destrói a
humanidade, e sim a protege, e enquanto promove uma profunda convicção da
unidade fundamental da família humana e da igualdade e dignidade de todos os
seres humanos e um sentimento de inviolabilidade do indivíduo e de sua
consciência” (o.c.p.278).
Conclusão.
A sabedoria popular soube interpretar a situação em que vive o ser humano
inventando o jargão “entre a cruz e a espada”. Essa expressão resume a situação
vivida e na Europa e adjacências durante milênios de anos. Hoje em dia corremos
o risco de transferir essa mesma situação deslocando o eixo desde a Europa para
a América do Norte e adjacências reinventado a mesma realidade da cruz e a
espada. Na Europa se aliavam os reis e o império aos Papas e à Igreja. O mundo
corre hoje o mesmo perigo se o leão e um Trump fizerem alianças, já que ele
teve a ousadia de se vestir de Papa e declarar “eu gostaria de ser Papa; seria
a minha escolha n.1” (www.G1 Redação com Reuters
29/04/25).
P.Casimiro João
smbn
www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br
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