O Papa São João XXIII quando anunciou o Concílio Vaticano II disse: “A Igreja é, e quer ser a Igreja de todos e principalmente a Igreja dos pobres. Porém os bispos, por conta de atender às condições da Europa que vivia nos inícios de uma teologia do progresso e da consagração do profano, esqueceram bastante esse problema”(Gustavo Gutierrez).
Aquela
recomendação do Papa João falou mais alto no pós-concílio nos bispos da América
Latina, e com um representante como Dom Hélder Câmara, que promoveu várias
reuniões com os bispos do Brasil nos intervalos das Sessões. E foi dessas
reuniões que surgiu a CNBB da qual o Dom Helder foi o fundador, como sendo a
primeira Conferência mundial dos bispos de uma nação. E entre as figuras que
estiveram presentes como teólogos no Concílio foi o teólogo peruano Gustavo
Gutierrez, o pai da Teologia da Libertação.
Gustavo,
quando em 1965 foi pároco na cidade de Lima, capital do Peru, num bairro pobre,
tinha a seguinte preocupação na sua cabeça: “como dizer ao pobre que Deus o
ama”? E daí começou distinguindo dois tipos de pobreza: primeiro, a
pobreza real de cada dia; a segunda, a falta de consciência e de compromisso
daqueles que dizem “deixa pra lá, entrega tudo pra Deus, e cruzam os braços
como se nada estivesse nas mãos deles.
Em
1969 veio para o Brasil, e aqui teve ocasião de aprender muito com o episcopado
brasileiro, onde já se estava fundando a CNBB com o compromisso pelos
empobrecidos. E ele viu que aqui já se falava nisso, os pobres não são pobres,
mas empobrecidos. Isto é, se você é roubado de tudo que tem, você fica
empobrecido. Você não nasceu pobre, é empobrecido, quer dizer roubado.
Porém,
nas teologias do Vaticano os Cardeais não estavam nem aí com essa situação. Foi
nessa época de 1984 a 2004 que a teologia do Padre Gustavo Gutierrez ficou sob
suspeita e investigação. Foi também que essa suspeita caiu também em Leonardo
Boff.
É
digno de nota que nessa época saiu, de Roma, uma Carta para o presidente dos
Estados Unidos da América do Norte, Ronald Reigan, em 1984, para que proibisse
na América Latina a Teologia da Libertação. Pela história, esse presidente
R.Reigan foi o maior imperialista que iniciou os maiores abusos contra a
América Latina.
Com
a criação da “Nova Ordem Mundial” ele tornou-se o cacique mundial ao qual a Europa
e Américas ficariam sujeitas, na época da queda do Muro de Berlim (1989).
E claro, como a política encontra muitas vezes um aliado forte na ideia religiosa,
promoveu o Instituto nacional da Religião para ser o tentáculo de dominar o
mundo pela sua “mística” de viés cristão ao seu jeito. Aproveitando-se também
do surgimento do Fundamentalismo protestante que prosperava nos Estados
Unidos desde 1920.
Um
dos pilares do Fundamentalismo protestante era a ideia fixa do retorno de
Cristo que estaria próximo, e por isso seria inútil tirar os pobres da sua situação de pobreza e
miséria e exploração. Foi assim que Ronald Reigan junto com o Fundamentalismo religioso americano promoveram uma guerra declarada contra a Teologia
da Libertação com as bênçãos do Vaticano.
Porém,
de outra forma teria agido Roma se olhasse para estas palavras de São João
Crisóstomo quando diz: “é um cisma separar o sacramento do altar do sacramento
do irmão, e dissociar o sacramento da Eucaristia do sacramento do
pobre”. (In José Tolentino de Mendonça, “O Elogio da sede”,138).
Assim
como para os questionamentos de Dom Hélder Câmara: “O que fizemos com a mensagem de Cristo?
De que maneira a multidão dos pobres, dos exilados, dos marginalizados, dos sem-casa,
dos sem-terra, dos sem-nada pode acreditar que o Criador é Pai que os ama, se
nós que nos dizemos cristãos, continuamos a deixar o prato deles vazio”? (id).
Porém, em 2016 novos ventos sopraram no Vaticano. Nesse ano de 2016 o teólogo Gustavo
Gutierrez, do Peru, Jon Sobrino da Espanha, e Leonardo Boff do Brasil foram
recebidos pelo Papa Francisco em Roma para a sua reabilitação teológica, pois
os seus livros tinham sido proibidos pelo Papa anterior e pelo Card.Ratzinger
quando Prefeito da Congregação da Doutrina Cristã.
Após
aterrissar em Roma, ao ser recebido pelo Papa, Leonardo Boff perguntou direto
ao Papa Francisco: “Santo Padre, mas o outro ainda está vivo, ele não aceita”.
“ - Sim, mas o Papa agora sou eu”, respondeu o Papa Francisco. Dá para ouvir as
palavras do Roger Cipó, filósofo e fotógrafo brasileiro: “A branquitude decide
quando nos ouve ou não”.
Na
entrevista a Leonardo Boff, o jornalista Joachim Frank em 25/10/2016
perguntou-lhe se a encíclica do Papa “Laudato Si” tinha a colaboração do
teólogo Boff. Boff respondeu: Sim, ele me solicitou material para a Encíclica,
e recomendou: “Não mande a papelada para a Cúria senão os funcionários
interceptam e eu não receberei; mande para o embaixador da Argentina, assim eu
vou receber”.
Esses
são os ventos novos da Igreja que mesmo assim ainda atrapalhados por estruturas
pesadas do passado. De novo vale ouvir a afirmação do Roger Cipó: “A
branquitude decide quando nos ouve ou não”.
E parece até que a “a branquitude” da Europa estava sentindo saudades da Inquisição, e da colaboração com os Impérios, como no caso da Carta para o presidente dos Estados Unidos da América do Norte.
Obs. Para a Entrevista do jornalista Joachim Frank veja a Fonte: www.ihu.unisinos.br
P.Casimiro smbn