segunda-feira, 7 de agosto de 2023

Sempre no evangelho palavra por palavra de Jesus?

 

Na leitura do evangelho, às vezes pensamos que estamos lendo palavras de Jesus, e estamos lendo palavras de um cristão qualquer anônimo ou pregador daquela época que comentou, e essas palavras ficaram lá no evangelho. Não imaginamos também que os livros naquela época não eram como os de agora, quando a imprensa foi inventada por Gutenberg no século XV. Não era raro que fossem folhas soltas ou amarradas de alguma maneira, e alguns comentários e outras histórias iam sendo escritas e amarradas junto com os primeiros originais que recordavam as palavras de Jesus. E esses primeiros originais andavam de boca em boca antes de serem escritos, e aumentados ou diminuídos, e modificados. E assim aos trancos e barrancos foram engrossando e aparecendo os evangelhos. Até que no século IV foram definidos os escritos no cânon, isto é, declarados como evangelhos. E com a seguinte recomendação: Que daí em diante ninguém podia mais ajuntar ou escrever comentários ao que já estava escrito; o nome de Cânon é isso mesmo, e significa Lista, definindo os escritos como intocáveis por mais ninguém. Observação: Os judeus faziam a mesma coisa nos seus escritos do Antigo Testamento juntando coisas e comentários. Até que eles também decidiram acabar com esses aumentos e comentários, sabe quando, no séc.II d.C. portanto dois séculos antes. É por isso que eu comecei dizendo: Na leitura do evangelho, às vezes pensamos que estamos lendo palavras de Jesus, e estamos lendo palavras de um cristão qualquer anônimo ou pregador daquela época. Isto é o que diz justamente o Comunicado da Pontificia Comissão Bíblica: As palavras da Bíblia não são “palavra por palavra” como palavra de Deus. (Pont.Com.Bíblica, 1944, cf www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br 30/7/23). Exemplos ou indicações disto se mostram nas ultimas Edições dos Folhetos Litúrgicos mensais da LITURGIA DIÁRIA da Editora PAULUS. Alguns trechos do evangelho trazem uns colchetes a vermelho separando a leitura longa da leitura breve, significando também: até aqui é do primeiro original, daí para a frente é comentário, e você pode ler ou não ler na celebração, é opcional. Vamos dar o exemplo de Mt.13, 44-52. Antes dos colchetes teríamos o original, e depois o que foi aumentado. E vejamos a diferença: no original onde a palavra chave é o Reino dos Céus, a finalização é que o joio, no final da história, não vai servir para fazer parte do Reino dos Céus; somente o trigo  vai servir para o Reino dos Céus. Porém o homem do comentário mandou logo o “joio” i.é, os “maus” ir para o inferno. Na verdade naquela época não se respeitavam as opiniões contrárias ou discordantes, eram logo mandados pro inferno quem fosse diferente. Ninguém podia ter outra opinião. Mandavam logo pro inferno. Inclusive nas próprias Cartas de João consta que houve um cisma, uma parte da comunidade que mantinha outra opinião, e o autor da Carta insurge-se contra eles com termos injuriosos como “anticristos” (1Jo.2,18; e 2Jo,3,10), e “filhos do diabo”(1Jo.3,10),Cf. Raymond Brown, “A Comunidade do Discípulo Amado”, Paulus,2020, pag.107).  Neste comentário que referimos o Filho do Homem enviaria os seus anjos e eles iriam jogar os “homens maus na fornalha de fogo onde haverá fogo e ranger de dentes” (Mt.13, 41). Sabemos que isto aconteceu também no séc. XVI nas condenações contra os protestantes. A Igreja católica condenava eles, e eles condenavam os católicos. Hoje sabemos que todos somos irmãos e “cristãos”, e ninguém condena mais ninguém. O Papa São João Paulo II e o Papa Francisco já pediram perdão, o Papa João Paulo II em 12/3/2000; e o Papa Francisco em 25/01/2016. Deus respeita os protestantes, e respeita os católicos igualmente. Então o católico respeita protestante e o protestante tem que respeitar o católico. Deus respeita as religiões da China, da Indonésia, da Pérsia, da África e da Amazônia, do Japão e os Afro-brasileiros. E nós temos que respeitar também. Igualmente na família, o esposo respeitar a esposa, os pais respeitar os filhos, os filhos respeitar os pais; e os governos devem respeito a todos, e as populações que optaram pela diferença de gênero. Se Deus nos respeita porque é que não devemos respeitar também uns aos outros? E a teologia atual tem a certeza que Deus “falou” pelos profetas das outras religiões como pelos profetas da religião de Israel. Será que Deus estará se limitando à geografia e ao povo judeu? O Concílio Vaticano II fez esta afirmação ecumênica: “A Igreja nada rejeita do que há de verdadeiro e santo nas outras religiões”.(Vat. II, Nostra Aetate, n.2). E ainda: “Não podemos invocar Deus como Pai comum de todos, se nos recusarmos a tratar como irmãos alguns homens, criados à sua imagem” (id.n.3). Segundo a definição atual de “Inspiração”, ela é a experiência pessoal do divino na mente e na vida vivida de um personagem. E em toda a superfície e em todas as nações do planeta, em todos os tempos homens e mulheres tiveram experiências fortes do divino. Algumas dessas pessoas escreveram e outras nem tanto. Mas todas que seguiram esse espirito que os transformou, eles o comunicaram e comunicaram sua experiência a inúmeras pessoas, ou a uma nação inteira.(Cf. M. Morwood, “O católico de amanhã”, p.52). Foi assim que antes ainda que os Judeus existissem apareceram tradições e religiões mais antigas que os judeus onde Deus já tinha se manifestado. Os judus não são os únicos e nem os primeiros.

Conclusão. Agora se torna mais fácil dar a resposta à pergunta inicial: Sempre no evangelho palavra por palavra de Jesus?

P.Casimiro João  smbn www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br


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