As Cartas de João mostram mazelas e
polêmicas nos inícios da Igreja. Porém, esses desconfortos tornam-se mais
relevantes depois do evangelho, nas Cartas joaninas. Para o autor Raymond Brown, que estudou o
assunto durante trinta anos, isso “mostra um quadro mais leal da vida da
Igreja, “com mazelas e tudo”. (A comunidade do discípulo amado, Paulus, 8ª
edição, 2020, p.9).
Ele nos surpreende com uma afirmação
que nem esta: “O meu interesse aqui é a aplicabilidade do termo religioso “seita”
à comunidade joanina em relação às outras comunidades cristãs do final do
século primeiro. J.N. Sanders e M.R.Hilmer propuseram que o 4ºevangelho foi
primeiro aceito por grupos que poderiam ser classificados como
heterodoxos”(o.c. p.12).
Outro argumento a favor do sectarismo
joanino é que este foi o primeiro evangelho a ser adotado nas comunidades
gnósticas do século segundo. Internamente o 4º evangelho era anti-sacramental
ou não sacramental. Mais tarde é que um autor desconhecido fez os
acrescentos referentes à “água do batismo” e o acréscimo referente “à carne e o
sangue da eucaristia” (Jo.6). Ele tem também uma posição anti-institucional
contra a orientação de Pedro; e baseando-se na autoridade do Pneuma, Espírito.
Quanto à Cristologia, é desenvolvida no
formato do docetismo. Em Jo.19,35 na afirmação de “testemunha ocular”
há uma clara evidência de que o evangelista está claramente modificando a
imagem histórica do ministério de Jesus para seus interesses teológicos”
(o.c.p.19). Em consequência, “só com grande circunspecção é que se pode usar o
evangelho de João como fonte histórica” (M.Jonge,18).
Há outras omissões, como a omissão do
termo “igreja”, “concepção virginal”, “apóstolo”, no evangelho de João e
omissão da “ação eucarística sobre o pão e o vinho” que colocaram em sérios
apuros a primitiva igreja para reconhecer como canônicos os escritos
joaninos.
Já publiquei neste local em matérias
anteriores que os primeiros Padres foram levados a aceitá-los no cânon devido à
seguinte confusão: eles consideraram como autor o “discípulo Amado” e “Ancião”
como sendo o apóstolo João. O que foi posteriormente considerado falso por
evidências e documentos descobertos posteriormente. Qual era então o “discípulo
amado” e “Ancião”? Era o cristão-judeu mais velho da comunidade deles, o mais
avançado em idade e que tinha algumas vezes acompanhado Jesus não como
apóstolo, mas como discípulo e “penetra”. E “Amado” porque eles
chamavam a sua comunidade de “comunidade amada”, ou discípulo amado,
porque o evangelho transformou aquele discípulo no herói da comunidade.
E se o “discípulo amado” não era o apóstolo João também não tinha estado
na última Ceia. (Cf. BLOG www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br
07/02/2021).
Na verdade, como diz Richard Bauckhan:
“Alguns escritores do segundo século estavam conscientes de que este homem “o
Ancião” não era o João, o filho de Zebedeu. No decurso do tempo,
porém, os dois chegaram a ser confundidos. As evidências mais antigas
foram mal compreendidas por terem sido lidas à luz das mais recentes”
(Testemunhas Oculares, p.530).
Falando em “mazelas” e seitas e
polêmicas do início, lembramos que houve a formação de dois grupos que se
desenvolveram dentro da própria comunidade joanina, como é demonstrado na 1
Carta (1 Jo.2,19). A dissolução destes dois grupos se deu depois que as Cartas
foram escritas.
Havia os “separatistas “ e os “conservadores”. Aqueles seguiram o caminho do docetismo
e agnosticismo. Os conservadores foram-se misturando com as outras
comunidades mais ortodoxas e
institucionais, mas pagaram o preço de renunciar à sua Pneumatologia que dava mais
independência à atuação do Espirito e menos institucionalidade,
assim como à pré-existência do verbo.
Existe o ditado que “foram-se os
anéis mas ficaram os dedos”. Foi o que aconteceu com esses dois
grupos. Foram-se os elementos, mas ficaram
os escritos e os formatos de suas teologias. Foram-se os anéis
mas ficaram os dedos e as marcas de suas teologias no evangelho de João com as cores
do docetismo e gnosticismo, anti-instituição e pneumatologia e a pré-existência
como marcas dos escritos joaninos.
P.Casimiro
João
www.paroquiadechapadinha.blospot.com.br
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