domingo, 21 de novembro de 2021

O que quer dizer “Para Deus tudo é possível” ?


 

Em primeiro lugar, São Tomás de Aquino comentava assim: “Deus é onipotente para as causas possíveis” (S.Tomás). Por exemplo, eu não posso pedir a Deus que 2 + 2 sejam cinco mas posso pedir que eu multiplique muitas vezes 2 x 2 pães em favor dos outros em vez de ser só para mim.

A expressão “para Deus tudo é possível” é usada na Bíblia (Mc.10,27), e tem sua raiz na história do povo de Israel, na teoria da escatologia, ou fim dos tempos. Isto é, já que os Judeus lutaram tanto para ser o povo dono do mundo e não conseguiram, então jogaram essa “ilusão” para o fim dos tempos ou do mundo.

Nesse longínquo “fim do mundo” viria Deus descido dos céus e nas nuvens, para se vingar dos inimigos do seu povo, e dos ricos e poderosos que maltratavam os pobres o tempo todo. Para eles não seria possível essa vingança, mas para Deus sim. “Ó Senhor, Deus vingador; Intervém! Levanta-te, juiz da Terra; retribui aos orgulhosos o que merecem” (Sl.94,1-2).  Copiando para o Novo Testamento, “Minha é a vingança; eu retribuirei”, diz o Senhor” (Rom.12,19).

E a transposição dessa ideia para o Novo Testamento: “Como é difícil para os ricos entrar no reino de Deus; é mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha do que um rico entrar no Reino de Deus; Para os homens isso é impossível mas para Deus não, para Deus tudo é possível” (Mc 10,23.27).

Aliás, no conceito dessas afirmações vem o que nós devemos ter em conta: o reino de Deus, que nos torna mais compreensível isso de “o camelo entrar no buraco de uma agulha”. Dias atrás os jornais falaram nos milhões de dólares que o ministro da economia e o presidente do Banco Central colocaram nos “Offshores” dos paraísos fiscais no estrangeiro. Eles ganharam e continuam ganhando  milhões em cada dia só com a subida do dólar.

Que aplicação tem aqui “passar pelo buraco de uma agulha”? Seria se esses homens ricos resolvessem de uma vez se tornar amigos e solidários dos cidadãos pobres do Brasil que não têm o que comer em cada dia, e até procurando ossos nos açougues das cidades do Sul. Se eles aceitassem distribuir os seus dólares ou ao menos devolvê-los ao Brasil e fazer uma economia solidária para a pobreza brasileira isso sim que seria “o camelo passar pelo buraco de uma agulha”. E seria o começo do Reino de Deus para eles a para uma parte do Brasil. Porque onde há partilha, e solidariedade e fraternidade aí está Deus.

Então esses dólares não iriam ser multiplicados só para eles mas solidariamente entrariam na economia do Brasil para que acontecesse mais partilha, mais solidariedade e mais fraternidade. Ainda funciona muito o imaginário do Antigo Testamento que nesse longínquo “fim do mundo” poderá vir Deus descido dos céus e nas nuvens, para se vingar dos que maltratam os países  e são causadores da pobreza mundial.

Mas quando eu digo que “para Deus tudo é possível” posso estar tirando da mim a responsabilidade de transformar as estruturas que mantêm as injustiças sociais. Dizer que “para Deus tudo é possível” pode significar a falsa ideia que a sociedade não pode mudar. Pode significar atribuir a Deus os males que existem como fomes, doenças, más governanças, porque eu não estou disposto a colaborar.

Pode significar ainda que quero continuar alimentando a minha pasmaceira em olhar as coisas correr sem eu mexer uma palha. Como se a casa estivesse pegando fogo, e eu na minha cadeira dizendo que “para Deus tudo é possível”, até mesmo que ele venha apagar aquele fogo.

É igual como na expressão fácil “Deus dá o jeito”, na realidade será porque eu não quero dar. Somos muito fáceis em terceirizar. E terceirizamos tudo em Deus, “Deus levou fulano”, “Deus por que levou o meu marido tão cedo”, e por aí adiante. Não será invocar o nome de Deus em vão?...

Não será também uma forma de terceirizar usando a expressão “para Deus tudo é possível”? O evangelho de Marcos coloca também na boca de Jesus, na hora da agoniaPai tudo, tudo te é possível, afasta de mim este cálice” (Mc.14,36); Mateus por seu lado, só as palavras,“Pai, se é possível, afasta se mim este cálice”(Mt.26,39). Lucas e João nada dizem. Nada de admirar, pois Marcos repetiu o imaginário do Antigo Testamento sobre o impossível.  Mateus já mudou para “se é possível”.

Concluindo: Se formos ao Antigo Testamento procurar mais influências teríamos que nos reportar ao imaginário das teorias do Criacionismo, desde os 9.000 anos a.C que fol inventada a escrita pelos povos sumérios e babilônicos em cujos escritos já aparece que Deus formou o homem do barro, e daí passou para o Gênesis. E não só, mas as estrelas, águas e animais tudo pela sua palavra. Esse imaginário perpassa transversalmente todas as épocas da história humana e chegou até à Idade moderna e nossa. Sabemos agora que Deus é parceiro e caminha junto com as nossas possibilidades e nossas impossibilidades.

P.Casimiro João     smbn

www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br

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