sábado, 30 de abril de 2022

Nicodemos e Jesus; quem era Nicodemos.


 

Segundo a narrativa onde Nicodemos fala com Jesus no cap.3 de João, Nicodemos inicia assim o seu bate papo com Jesus: “Ninguém pode fazer esses milagres que tu fazes, se Deus não estiver com ele”(Jo.3,2). No entanto, os biblistas se deparam com um pormenor que até ao presente ainda não foi resolvido: de João não ter narrado nenhum milagre em Jerusalém. Para ser certo, esta conversa deveria ser feita muito depois. Dado isso, os biblistas falam mais que ele certamente teria ido para investigá-lo.

Outros veem que, a ser verdadeira a cena, ela está deslocada do contexto de toda a narrativa do conjunto do evangelho de João. Sendo assim, questiona-se, além do lugar certo, também o seu conteúdo histórico. Para corroborar esta questão, Jesus fala no plural como se a Igreja estivesse falando, e como se o Filho do Homem já tivesse subido ao céu. Estes problemas levam alguns autores a considerarem toda a cena como uma criação joanina. (Cf.R.Brown, o Evangelho de João, vol I, 340).

Notamos ainda o tema que vem em seguida, da luz, que se encontra também no cap.12,44-49. “Muitos estudiosos sugerem que ao menos alguma parte é uma homilia da autoria do evangelista. A referência ao batismo tem levado autores a observar que toda esta exposição pareceria mais natural nos lábios de um Catequista cristão depois da fundação da Igreja do que dos lábios de Jesus como suas palavras no início de seu ministério.”(o.c.p.340).

Há ainda motivos para considerar esta narrativa como um midrash ou digamos parábola, usando o nome de um “fariseu” como príncipe dos judeus, “havia um homem entre os fariseus, chamado Nicodemos, príncipe dos judeus, que foi ter com Jesus, de noite”. Toda a encenação é desconcertante, e aponta para o seguinte objetivo: dar um exemplo para os judeus das Sinagogas de se decidirem à conversão e entrar na comunidade, no caso a comunidade joanina, que estava em jogo. Na verdade, os judeus que se convertiam corriam o risco de ser perseguidos pela Sinagoga, que eles deixavam, e por outro lado também o risco da perseguição por parte dos romanos quando fosse o caso. Para animar esses indecisos que estavam “em cima do muro” teria sido construída a cena do “Nicodemos”, um midrash ou, para nós, uma parábola. Note-se a terminologia nunca usada príncipe dos judeus  e ainda de noite, ou seja, por medo de ser reconhecido. E daí o autor parte para um “sermão” sobre o Batismo, começando com o exemplo de um fariseu ilustre, o qual depois é “reabilitado” quando teria colaborado no sepultamento de Jesus, junto com José de Arimateia,(Jo.19,39), numa cena também questionada, e que carrega consigo o final da lição ou midrash do cap.3 de João, como conclusão da catequese batismal.

Em segundo lugar, vem aí um tema que era o foco e o interesse principal da Igreja inicial, o tema de aceitar Jesus como salvador. “Quem nele crê não é condenado, mas quem não crê já está condenado” que tem o outro paralelo ”quem crer e for batizado será salvo; quem não crer será condenado” (Mc.16.16). Isto era o cerne das Catequeses do batismo, e tem suas raízes na herança do Antigo Testamento: a Circuncisão e a Torah. Assim como a Circuncisão era necessária para a salvação no Antigo Testamento, assim o Batismo para o Novo Testamento. E assim como a Torah era a fé de Abraão, assim agora a fé em Jesus Cristo. Esta herança vigorou como camisa de forças em toda a Idade Média. Acrescentando ainda a autoridade do Papa, o qual começou a ocupar o lugar do imperador como “dono do mundo”, e sendo considerado como o “rei dos reis” e não “havendo  ninguém igual a ele depois de Deus”(Dictatus Papae, de Pio IX).

Somente com o Concilio Vaticano II a teologia da salvação começou com uma outra luz: “A Igreja nada rejeita do que há de verdadeiro e santo nas outras religiões”(Decreto Nostra Aetate)sobre as relações da Igreja com as religiões não cristãs. Desde então nasceu a teologia da pluralidade das religiões e da afirmação da salvação presente em cada uma delas. No lugar do adágio criado por São Cipriano de Cartago no século III "fora da Igreja não há salvação" agora tem o outro adágio "fora da Igreja tem muita salvação". O Concílio Vaticano II reconhece nas outras religiões não cristãs"um valor salutar pela parte de verdade e santidade que elas contêm", e por isso se deve falar num pluralismo religioso de princípio e não apenas de fato", como diz Claude Geffré.(Ensaios de teologia inter-religiosa,p.38). Na verdade, todos esses valores foram confirmados na Declaração Universal dos Direitos Humanos em 1945, no tocante à liberdade de consciência e liberdade de religião. Vimos que a Igreja tinha ficado parada na proposição gnóstica de S.Agostinho, de que as crianças sem batismo não tinham salvação”, proposição adotada por diversos concílios, como Cartago em 418; Viena, 1312; Florença, 1412, e Trento, 1560, e que agora foi revogada.

Conclusão.Como conclusão, fica mais claro que o cap.3 de João sem dúvida pertence ao gênero das Catequeses batismais, iniciando com a camisa de forças que estava-se tecendo nessa época, e que não abrange só a época da primeira escrita do evangelho, mas retocada que foi e modificada em várias outras edições pelo século segundo, e terceiro, até se estabilizar no séc. IV quando foi definido o cânon dos evangelhos.

P.Casimiro João    smbn

www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br

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