Uma senhora de 60 anos, entrevistada
num supermercado, atribuía as culpas de não ser alfabetizada ao seu velho pai
que dizia “sempre foi assim, mulher não
vai à escola, sempre foi assim.”
Quem sabe, por conta desse “sempre foi
assim” há um grande país no mundo com 210 milhões de habitantes e tem 9 por
cento de analfabetos, ou seja 13 milhões. É um país chamado Brasil. Ocupa o oitavo
lugar no mundo do analfabetismo. Também não admira que tenha um ministro da
educação que declarava há pouco publicamente que “pobre não pode ser doutor,
isso é coisa de rico, e “sempre foi assim”. E, para adequar com esse objetivo
foram inventadas manobras para diminuir o número de alunos nas universidades e
alienar os jovens nas provas do ENEM, e das escolas. “Porque sempre foi assim”.
Um dia, entre as andanças pela Judeia,
um homem diferente não tinha problema de se misturar com gente de má fama, e
gente da rua, até para uma refeição. Os devotos e piedosos viam essa pessoa
com maus olhos e o reprovavam porque estava infringindo as leis sociais antigas
que proibiam essa promiscuidade. “Sempre
foi assim, com a nossa separação, e o fulano extrapola”. Esse homem diferente
atendia pelo nome de Jesus. E corria o boato que contava histórias como esta: o
filho caçula de um rico fazendeiro saiu com a sua herança na bagagem, e viajou
para a cidade grande, até gastar o último centavo. Quando se viu em apuros
voltou para casa, e foi bem recebido, como um príncipe. O irmão mais velho do
moço deu uma bronca no pai, porque não cumpriu a lei do castigo para esses
casos. É porque sempre foi assim, pai, você tem que castigar o caçula e não
está cumprindo a nossa lei.
Na época do 1960, do século passado, a
Igreja católica fez uma reflexão com o episcopado mundial, e entre os debates e
nas conclusões, ficaram resoluções que promoviam algumas mudanças para o
futuro, e o que podíamos chamar de “inovações”. Seria longo enumerá-las
aqui. Essa reflexão foi longa, a mais longa de todos os concílios, de tal forma
que entre as atividades e intervalos, levou quatro anos. Foi o concílio
Vaticano II. Pensado e promovido pelo Papa João 23, hoje São João 23, e
encerrado com o Papa São Paulo VI. Uma das inovações que são mais
materializadas e imediatas foi largar o latim nas Liturgias, e começar com as
línguas vernáculas. Outra, foi a postura do padre-celebrante que celebrava de
costas para o povo, veja só...Está na cara que estas coisas são como nos jogos
de futebol, em que o técnico fala sobre a postura durante o hino nacional e a
camisa que vestem. A filosofia do jogo é mais inacessível. Assim a teologia
resultante do Vaticano II ficou escondida e só quase na letra para grande
porcentagem no mundo. Mesmo assim, passados que foram poucos anos, tomaram
corpo reações tais como: assim não pode acontecer, como era é que está bem,
sempre foi assim, porque agora vai ser de outra maneira?
Bispos, padres, etc. se apavoraram e
tentaram de todos os jeitos voltar atrás. São como aquele irmão do caçula, os
que olham só para o passado, para trás. Se você olha só para trás não vai
caminhar nunca. Os críticos contam mesmo que um cardeal, após o concílio, teve
saudades do passado, e algumas vezes celebrou a missa em latim como antes do
concílio e de costas para a assembleia. E quem conta é o Hans Kung, que foi um
dos consultores do concilio. Paulo VI, no encerramento do concilio se despojou
da Tiara de três coroas (poder espiritual, poder de estado e poder sobre
os imperadores), e a tal tiara reverteu em favor dos pobres de Roma. Quando
esse eminente cardeal ocupou a cadeira
do Papado, procurou nos armários e baús do Vaticano outra semelhante para
usá-la. Foi o cardeal Ratzinger (H.Kung, A Igreja tem salvação, p.253).
Na verdade, o Card. Ratzinger, depois
Papa Bento 16, fez de tudo para ressuscitar a antiga liturgia de antes do concílio.
Driblando o Concílio de todos os modos ele fez um Motu Proprio onde escreveu
que se pode celebrar nas duas liturgias, a de Pio V (do ano de 1500) e do
Vaticano II. Pôs todo o empenho em recomendar a antiga Liturgia em latim e de
costas para o povo, assim como na administração dos sacramentos. Chegou até ao
ponto de conceder que algum bispo pudesse formar uma paróquia pessoal onde se
fizesse essa liturgia antiga. (Cf. Motu próprio, Bento 16, 7/7/2007). Os danos
causados por semelhante atitude revertiam não só em prejuízo para a Liturgia
mas recaíam também como em cascata contra a aceitação dos outros documentos do
Vaticano II.
Isso é o símbolo de atitudes do “sempre
foi assim”. Porém, é preciso renovação das mentalidades ao ritmo do Vaticano
II. “Acolher à mesa”, “acolher na eucaristia, acolher nos casamentos, segundas
núpcias, acolher os diferentes, acolher os homo, acolher os e as LGBTs.
Atenção, o filho mais velho pensava que “sempre foi assim”. Igualmente tem
acontecido. “Ah, mas a minha religião não permite. Cuidado, que antes da
religião existe o ser humano. Quem não respeita o ser humano por causa da
religião não é religioso. (Tg. 2,4). A religião pode atrapalhar o ser humano.
Antes de religioso é um ser humano. Se alguém deixa de ser humano para ser
religioso, não é ser humano e nem religioso.
CONCLUSÃO.
Por causa da religião do “sempre foi assim’, escreveu o Dom Angélico Sândalo
Bernadino, bispo de Blumenau: “Tivemos
enorme dificuldade na preparação, na realização do Concílio, e no pós-concílio
dentro da Igreja. Algumas chagas ainda sangram em consequência das mudanças,
que muitas pessoas bem intencionadas não compreenderam, agarradas que estavam a
certas tradições com “t” minúsculo, e certos costumes. Não conseguiram
abraçar a voz do Espírito que gritava naquele momento tão importante da
história”.
P.Casimiro João smbn
www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br
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