Antes a ciência era escrava da fé. A fé
era ditada pelo magistério da Igreja. E os teólogos recebiam a incumbência de
divulgar a fé e explicar os documentos da Igreja. Havia sempre a sombra e
ameaça da excomunhão. Nasciam daí os dois tipos de magistério: um magistério
soberano, absoluto e infalível, o da cúpula da Igreja; e outro magistério
subalterno. O primeiro era o “magistério eclesiástico”; o segundo, o
“magistério teológico”, distinção feita pelo alemão Hugo Grotius no século
XVII. Desde que a Igreja dominada pelo império recebeu a credencial de
liberdade do imperador Constantino, até o final da Idade Média, foram muitos
séculos deste esquema. Só mudou a situação com a chegada do Renascimento
iluminista e as suas descobertas como a liberdade de consciência e a liberdade
de religião, consideradas como as colunas e as alavancas da modernidade. A
duras provas aconteceu a emancipação dos poderes dos reis e no que toca à
teologia, e à ciência o diálogo mútuo. Em seguida chegou o processo da
libertação dos escravos das mãos dos reis e dos nobres e dos senhores feudais;
e de quebra a libertação dos direitos totalitários da fé sobre o magistério
teológico e a ciência. A duras provas
aconteceu tal processo mas aconteceu: a custo de excomunhões, ameaças, prisões
e torturas de cientistas e teólogos. Deste modo a ciência conseguiu seu status
de igualdade, com os mesmos direitos e de independência da fé. Até que hoje,
após o concílio vaticano II vivem lado a lado em boa harmonia e colaboração,
sem contar sempre aqui e ali com os retrógrados que sempre ficam amarrados ao
passado. O que acontece com aquele ditado: quem não avança volta para trás
porque a vida é movimento. A Igreja sentiu que devia se adequar com exigências
da ciência como controle de natalidade, métodos anticoncepcionais, pílula
anticoncepcional, comportamentos homoafetivos, e reavaliação da qualidade de
“pecados antigos” hoje vistos sob o prisma onde entra a ciência e a crítica
histórica, a psicologia e a antropologia, como os “pecados dentro do
matrimônio” e “masturbatórios”, “valor da virgindade” e suas motivações, assim
como o valor dado a manifestações afetivas antes duvidosas ou condenadas. Isto
posto, vejamos afirmações a respeito, de um dos maiores teólogos do séc.XX:
“Evidências científicas não podem ser detidas pela fé, podem contradizer certas
imaginações em torno da fé” (Schillebeeckx, “Jesus, a vida de um Vivente”,
pag.58). Por outro lado, o mesmo teólogo alerta sabiamente sobre as
dificuldades de quem estava acostumado com a fé antes da ciência: “Na hora da
divulgação dessas novas convicções há, muitas vezes, pouca compreensão para as
dificuldades dos fiéis em se acostumarem com essas novas ideias e assimilá-las.
De outro lado, o resultado crítico não pode ser silenciado, e isso exatamente
para o bem da fé cristã. A fé nada perderá por causa de uma verdade nova,
empírica, pelo contrário ganha muito” (o.c.p.59). Falei noutra página que até
há pouco tempo se dizia que a revelação terminou com a morte do último
apóstolo, o que agora é uma falácia porque ninguém sabe quando morreu o último
apóstolo, além de que quase todo o Novo Testamento foi escrito depois da morte
de todos os apóstolos, e ainda mais, sabe-se agora que a autoria do Novo
Testamento não é de nenhum deles mas das comunidades, com poucas exceções
mormente das comunidades da Síria. Avançando, vejamos mais: “A revelação, como
revelação, só está completa, a bem dizer, na resposta da fé surgindo de uma
situação bem concreta com horizonte próprio de perguntas. E nossas perguntas de
hoje são diferentes das do passado. (o.c.p. 54). No caso, a revelação tem duas mãos:
numa mão o que recebemos do Jesus de Nazaré, noutra mão a interpretação da
situação atual.
Conclusão.
Falou-se da dificuldade dos fiéis em se acostumar com as novas ideias. “Um fato
é que no passado os fiéis e até os teólogos e o magistério consideravam todas
as tradições do N.T como relatos diretos de acontecimentos históricos. A
teologia e as repostas da fé baseavam-se também numa interpretação pré-crítica,
puramente biblicista, da história de Jesus, uma vez que não se discerniam, por
ex. a diferença entre os gêneros literários, e que cada época é inevitavelmente
sujeita a limitações do seu próprio contexto histórico(o.c.p.58). Daí vem a
necessidade de entender as dificuldades dos fiéis para se adequarem com a nova
realidade que está surgindo. Mas tem que ir acontecendo.
P.Casimiro João smbn
www.paroquiadechapadinha.blogpot.com.br
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