sábado, 19 de dezembro de 2020

A Teologia da Libertação e o Regime da Ditadura Militar no Brasil.


 

Dizia um slogan da Teologia da Libertação: “Devemos defender os Pobres”. Diz um slogan dos Governos: “Devemos defender-nos dos Pobres”.

Como assim? As Nações, no geral, são fábricas de pobreza para uma metade da sociedade, enquanto aumentam a riqueza para outra metade. As classes esquecidas são frutos da fábrica da pobreza. E aqui há uma progressão geométrica: quanto mais aumenta a fábrica que produz os ricos mais aumenta a fábrica que produz a pobreza.

Os mandatários do governo vêm da fábrica que produz a riqueza. E eles já têm a receita em rótulos para se defender da classe da pobreza: são “agitadores” e “desordeiros”. Se ficam quietinhos no seu silêncio escondido não perturbam a “ordem” dos ricos. Se vão para a rua protestar, o governo bota a policia, os cavalos e as bombas. Eles vão dizer que são pobres, que as panelas estão vazias, que os filhos não têm escolas. Aí o governo já tem o seu aparato de repressão para se defender deles.

Afinal, o governo também tem outra maneira para se defender dos ricos. Qual é? Aumentar o dinheiro para eles, projetos e salários. Ele faz como aquela madame do Rio de Janeiro que dizia: “eu gosto muito dos pobrezinhos, a última vez que eu vi um, foi junto do bueiro, e eu dei-lhe um empurrãozinho para cair no buraco”.

Na história da Igreja praticamente também tem acontecido coisa semelhante: Tem teologias que se declaram pela defesa do pobre. E tem teologias que se declaram para se defender dos Pobres, acontecendo assim como com os governos. Esta última agrada aos Governos. Enquanto que a teologia que defende os pobres é tachada de “comunista”.

Nosso Senhor Jesus Cristo iniciou a vida pública assumindo o programa do profeta Isaias: “O Espirito do Senhor está sobre mim, ele me enviou para dar a Boa Nova aos Pobres, para proclamar a libertação dos oprimidos e a liberdade aos prisioneiros”(Is.61,1-4 e Lc.4,18-20),

A Boa noticia ela não é neutra, ela é boa para uns, e ruim para os outros. Se ela é boa para os pobres, se torna ruim para os poderosos. É contraditória. João Batista e Jesus Cristo começaram com essa Boa Nova. Os poderes da nação e da religião procuraram logo se defender deles. Não traziam boas noticias para eles.

Essas palavras do profeta Isaias, e a vida de João e de Cristo são o princípio da Teologia da Libertação: Defender o pobre. Quando a Igreja começou imitando e copiando os métodos do Império após o Edito de Constantino (313), começou em larga escala a se defender dos Pobres e fazendo alianças com os centros de poder e de riqueza. E a teologia foi seguindo por esse caminho. Porque tem aquele adágio em latim: “agere sequitur esse”, i.é, o agir segue o ser e o pensar.

Passando pela Idade Média, onde as associações de libertação dos oprimidos, com raras exceções eram perseguidas e excluídas, como os valdenses, e por pouco os franciscanos, chegamos a uma época que após o Concilio Vaticano II surgiu a Teologia da Libertação. Porém, antes da teologia da libertação tinham chegado outros movimentos da libertação do espirito humano, que culminaram na Declaração Universal dos Direitos Humanos se tornando o fulcro central a Revolução Francesa (1788) com os 3 pilares “Liberdade, Fraternidade, Igualdade”.

Todo o século 19 foi testemunha do surgimento de movimentos todos nascidos desses pilares de Liberdade, fraternidade, Igualdade. Como consequência, a teologia da libertação foi também um despertar para a Igreja.

Porém, estando em andamento, o Estado brasileiro passou a persegui-la quando justamente institucionalizou a repressão às liberdades civis no ano de 1964 com a Ditadura Militar. O mundo estava no ambiente da Guerra Fria, Estados Unidos versus Rússia. E com o medo do Comunismo.

O Brasil vivia um ambiente de euforia com a construção da nova Capital, Brasilia. O presidente João Goulart tentou uma politica de diminuir as desigualdades sociais no país. E propunha algumas medidas muito sérias: A Reforma agrária, educacional, fiscal e urbana. Antes dele, Jânio Quadros tinha aberto o país às relações diplomáticas e comerciais com todas as Nações do mundo.

Isto começou a não agradar a muitos Grupos econômicos que tinham os seus monopólios. E sobretudo desagradou aos Estados Unidos que não permitiam que alguma nação se relacionasse com seus inimigos políticos, sobretudo a Rússia.

Por outro lado, Jânio Quadros fez o primeiro Embaixador negro do Brasil, fez o Parque Nacional do Xingú e concedeu muitos direitos aos Índios e combateu a corrupção.

Este processo foi barrado diretamente, digamos logo, pela política dos Estados Unidos, que enviaram recados e dinheiro aos governos e aos Militares brasileiros para parar com isso. E conseguiram. Os Estados Unidos começaram a treinar agentes de tortura e repressão para mandar para o Brasil.

Assim os Estados Unidos e as classes altas prepararam o caminho para que os Militares dessem o golpe militar e implantar a Ditadura Militar em 31 de Março de 1964. Houve quase um milhão de mortos e desaparecidos civis, além de genocídio de milhares de Índios. Inclusive mandando aviões para espalhar veneno na Amazônia. Os torturadores recebiam cartas com dólares todos os meses, dos Estados Unidos.

Como os Estados Unidos tinham medo da Rússia, espalharam esse mesmo medo por toda a América do Sul, e para eles, tudo que não fosse dos Estados Unidos era comunista. Então o comunismo virou bicho-papão para eles puderem perseguir, prender e matar. Esse bicho papão ainda hoje está na cabeça de muitos militares brasileiros.

A teologia da libertação foi sufocada na Ditadura, e teve muitos mártires, a maioria da Ordem dos Pegadores ou Dominicanos: Entre eles Frei Beto, que sobreviveu depois de passar 4 anos nas cadeias e nos porões, sem janelas e sem banheiro, e conseguiu escapar da morte, Frei Fernando, Frei Ivo, Padre Augusto, Frei Georgio, Frei Mauricio e Frei Tito Alencar, que foi pego assessorando o 30.º Congresso nacional da União Nacional dos Estudantes (UNE), e sucumbiu ao martirio. Nessa perseguição à UNE foram presos mais de 700 estudantes, e assassinados os dois líderes universitários Alexandre Vannucchi Lemos e Honestino Guimarães.

Frei Tito: Os militares mataram-no se divertindo atirando o corpo dele para dar com a cabeça contra as paredes da cela por dias seguidos. Queimavam o seu corpo com pontas de fogo diariamente, mormente na boca dizendo que “era para tomar a hóstia”. Com isso o governo americano conseguiu a obediência dos Militares brasileiros, e enfraquecer a Teologia da Libertação.

Na verdade, Frei Beto tem a seguinte afirmação: “Todos nós cristãos somos discípulos de um prisioneiro politico, Jesus, preso, torturado e condenado à morte por dois poderes, politico e religioso”. 

Alguns setores da Igreja acusam a teologia da libertação de usar métodos do marxismo. Ora os métodos não têm religião. Estão querendo "botar água no feijão da Santa Ceia". Como diz Marcella Reid, "eu estou falando de evangelho, e eles estão desconversando de métodos" ou de papo furado, ou  de água no feijão da Santa Ceia", querendo lavar as mãos como Pilatos e jogar a água no feijão.

Alguns bispos fizeram raras visitas a alguns Freis presos nas masmorras. Dois deles, depois foram cardeais. Um deles, cujo nome omito aqui, numa visita de meia hora, viu prisioneiros torturados e sangrados, mas os miliares lhes disseram na gozação que “tinham caído de uma escada”.  E as palavras que falou para os Freis foram: “Ah, vocês são todos envolvidos com os terroristas, não é?” Dali a algum tempo foi nomeado cardial, e em Roma numa missa falou infelizmente que “no Brasil não tem tortura”.

Um outro, Dom Lucas, agora já falecido, viu o Frei Tito torturado e sangrando e os Freis pediram-lhe para fazer um depoimento. Ele se recusou dizendo que “não quero prejudicar minha amizade com os meus amigos militares”. Será que eles tinham a teologia de defender os Pobres, ou a teologia de se defender dos Pobres, igual os governos? Ou não foi o caso de "lavar as mãos também"?

Eu disse atrás que tudo que não fosse dos Estados Unidos era “comunista”. Então o comunismo virou bicho-papão para eles puderem perseguir, prender e matar. Aqui em Chapadinha na época de 1980 não se podia falar em “Comunidades”, porque era “comunismo”. Tinha um delegado que  dizia que as comunidades eram “células comunistas”, e eram para tirar as terras dos fazendeiros.

Os primeiros dirigentes das comunidades católicas ou comunidades eclesiais de base foram presos. E os sacerdotes difamados nos jornais como comunistas. Várias ocasiões foram intimados perante o juiz da cidade, ameaçados de prisão e expulsão.

Esse bicho papão de usar o “comunismo” para barrar tudo que é direitos das classes pobres ainda hoje está na cabeça de muitos militares e governantes com formação militar. O pobre quando reclama é “comunista” e é fim de papo. Vai levar tempo para higienizar a cabeça de tantos que foram infetados com esse vírus da época da Ditadura militar, e desse veneno que foi deixado no Brasil pelos Estados Unidos da América do Norte.

Obs: Veja a lista de Teólogos da Libertação do Brasil e do estranjeiro: Andrés Torres Queiruga, Jean Luis Segundo, Gustavo Gutierrez, Carlos Filipe Ximemes, João Batista Libanio, Jon Sobrino, Camilo Torres, Carlos Mesters, José Comblin, Jorge Pixley, Clodovis Boff, Leonardo Boff, Domingos Barbé, Elza Tamez, Marcella Althan-Reid, Enrico Dussel, Marcelo Barros, Milton Shwants, Pablo Richard, Erwin Krautler, Frei Beto, Pedro Casaldaliga, Hélder Câmara, Hugo Assmann, Paulo Evaristo Arns, Roselvo Sagues, Ruben Alves, Ignacio Ellacuria e Samuel Ruiz.

P.Casimiro     smbn

www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br

 

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