Noutra página falamos no tipo de
epopeia em que parece estar redigido o livro dos Atos dos Apóstolos como
está sendo assumido pelos estudos atuais. Vejamos: “Os relatos dos primeiros
capítulos do livro dos Atos dos Apóstolos não constituem fonte confiável para as
origens das primeiras comunidades cristãs; Tendências lendárias e idealistas
impregnam esses capítulos.” (Helmut Koester, Introdução ao Novo Testamento vol.
II §8, p.102). Mais à frente fala que o livro trata os apóstolos Paulo e Pedro
como são tratados os heróis da Ilíada e da Eneida, de Homero; o que leva a crer
que o autor tinha em mente as epopeias de Homero onde se inspirou para a
composição do Livro Atos dos Apóstolos. (o.c.&9,p.158). Falemos então sobre
Paulo. Em primeiro lugar, há uma discrepância entre o livro dos Atos e as
Cartas acerca da procedência de Paulo. Em Atos se diz que Paulo era cidadão
romano. E nos fragmentos das Cartas aos Filipenses, 2Coríntios e Gálatas Paulo
descendia de uma família israelita da tribo de Benjamin, circuncidado ao oitavo
dia, e membro da seita dos fariseus (Fil.3,5); 2Cor.11,22; Gl.1,14; 2,15), o
que nos tira do sério sobre a historicidade dos Atos como dissemos. Podemos
enxergar vários exageros e absurdos sobre a valentia e braveza de Paulo no
referente ao seu esforço persecutório narrado nos Atos. Vejamos o que nos dizem
os estudiosos: “O relato do livro dos Atos diz mais do que é possível
acreditar: a presença de Paulo na morte de Estêvão é excluída em Gl.1,22; É
impensável que Paulo recebesse cartas dos sumos sacerdotes, pois nem os sumos
sacerdotes nem o Sinédrio jamais tiveram esses poderes para fazer isso.”
(o.c.§9,p.115). O que realmente começou acontecendo foi que os próprios judeus
começaram a excluir os cristãos das suas Sinagogas mormente depois do congresso
de Java no ano 70 d.C. Pois daí em diante eram considerados como uma seita
ilegítima judaica, e por isso sujeitos à lei romana da perseguição pois eles
tinham perdido os direitos que eram só dos judeus. E o que dizer sobre as
narrativas de “vocações” com sabor e ao jeito do Antigo Testamento? Acontece
também na narrativa da famosa “conversão de Paulo o mesmo jeito épico e
lendário do Antigo Testamento. Os estudiosos dizem que o chamado de Paulo “é um
escrito no estilo de lenda”, como as lendárias vocações proféticas. De quebra,
é introduzida outra narrativa como um galho nos diálogos entre Paulo e Ananias,
o que cria um ambiente mágico e fabuloso próprio do gênero épico de todo o
livro, como outros episódios da soltura de Paulo do meio das correntes e das
grades das prisões, equiparando assim os dois heróis de Atos com os heróis da
Ilíada, Ulisses e Aquiles ou da Eneida, Eneias e Agamenon. Aliás, heróis que
quebram correntes, somem e se tornam invisíveis e quebram colunas, que andam
sobre ondas do mar, são comuns em poemas antigos, como os de Apolônio de Tiana,
Ben Adab, e Sansão no poema do livro dos Juízes. Aqui os heróis são Pedro e
Paulo. Vendo mais sobre Paulo: “Embora o livro dos Atos dedique um total de 7 capítulos
à narrativa do julgamento de Paulo e à sua viagem a Roma, não existem dados
historicamente confiáveis sobre essa
viagem e julgamento. O discurso ao povo depois da prisão (At.22), seu
comparecimento diante do Sinédrio (At.22,30), e o seu julgamento diante de
Festo e Agripa II, como o relato completo de naufrágios (At. Cap.22 e 23) são
produtos da habilidade novelística de Lucas “ (o.c. §9, p.158). Também não há
certezas sobre o fim da vida de Paulo. “O propósito da épica de Paulo é o
seguinte: terminar a história que começou em Belém e Jerusalém, e terminar com
a chegada vitoriosa do evangelho à capital do império, e daí conquistar o
mundo.” (o.c.§9,p.158). Este é o objetivo da obra de Lucas em Atos e no
evangelho, dois livros que primitivamente eram um só Livro. Originalmente Lucas
escreveu um único livro, que compreendia Atos e Evangelho contando toda a
história desde o anúncio do nascimento de João Batista até a chegada e pregação
do apóstolo Paulo em Roma. E o que contribuiu para essa divisão em dois livros
Atos e evangelho? Há uma razão no sentido de considerar Atos um romance em que
histórias prazerosas de prodígios, maravilhas, e especialmente histórias de
naufrágios, soltura de prisões e quebras de grades e correntes são apropriadas.
Nos contos épicos do mundo greco-romano, especialmente de Eneida de Virgílio
estes elementos são essenciais. Além do mais os críticos têm mais a acrescentar
sobre o prólogo de Atos, que terá sido um grande acrescento feito entre os
séculos II-IV” indo buscar elementos do Antigo Testamento. (o.c.§12,p.330).
Conclusão
Encerro este resumo com as conclusões de H.Koester: “A obra de Lucas é uma
epopeia da instituição da Igreja que substitui a epopeia de Israel,
especificamente a história do êxodo do Egito por uma nova história que sela a
separação de cristãos e judeus” (o.c.§12, p.332). Justamente com esta finalidade
podem acontecer dúvidas, ou ser consideradas inverdades muitas narrativas hoje
consideradas lendárias, segundo o gênero épico em questão. Na verdade, quanto a
Paulo, “a tradição sobre sua chegada a Roma e o martírio sob Nero é lendária”
(o.c. §10,p.176). A crítica moderna se inclina, como lugar mais provável para o
martírio de Paulo em Filipos, segundo a análise das Cartas Pastorais, e
confirmado por recentes escavações. (Id.158). Para a crítica moderna também é
lendária a tradição da morte de Pedro em Roma, sendo o lugar mais provável na
Síria. Para Eduard Arns, “os Atos dos Apóstolos são uma história em forma de
novela”. (E.Arnes, “A Bíblia sem mitos”, p.231).
P.Casimiro João
www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br
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