O
Reino dos céus, no imaginário dos judeus não é o céu. Nem para Jesus e nem para
os apóstolos, mas era o Reino que com Jesus estava pra começar. “Não é agora que vais restaurar o Reino de
Israel” (At.1,6). Era o que estava também na cabeça de Pedro e dos Doze
apóstolos: “Quem é o maior no Reino dos
céus” (Mt.18,1); “para sentarmos no
teu Reino, um à tua direita e outro à tua esquerda” (Mt.20,21). Vamos apresentar uma cena em 5 Atos: 1º
Ato. Jesus terá segurado uma criança e terá dito: “quem receber em meu nome uma criança como esta é a mim que recebe”(Mt18,5)
E: “Se não vos tornardes como
crianças não entrareis no Reino dos céus”(18,4). Comparemos com outra
afirmação de Jesus: “Tudo o que fizerdes
a um destes pequeninos foi a mim que o fazeis” (Mt.25,40). Vale dizer estas
afirmações são paralelas. Receber uma criança equivale a receber o “menor”. Então
compreendemos que “criança” significa o “menor”, o “sem valor”. Fazer-se como
criança é se colocar no lugar do menor para fazer parte do Reino dos céus. Isto
então é o contrário do que pretendiam os Doze discípulos quando queriam um
Reino de grandeza e onde há ministros, chefões, coronéis, e donos de terras
onde eles seriam os primeiros. Significa tornar-se pequeno, fazer-se igual aos
outros, companheiro e amigo. Porque o orgulho se julga o maior. E o dinheiro é
o que faz o orgulho.
2º
Ato: “Não desprezeis nenhum destes
pequeninos porque eu vos digo que os seus Anjos veem sem cessar a face do meu
Pai que está nos céus”(Mt.18,10). Pergunto, e os outros Anjos não veem sem
cessar a face de Deus? O que significa? Vejamos: No Talmude (o Catecismo dos
Judeus) se dizia que cegos, coxos, mulheres, mudos, doidos e crianças não podiam
entrar na Sinagoga porque os Anjos deles tinham vergonha deles e tapavam a cara
para não olhar nem para Deus nem para eles. Daí se revertia a situação e se
afirma que sim, os Anjos deles não tapam a cara e não têm vergonha deles. É
deles o lugar na Sinagoga, no Templo e nos Reino dos céus.
3º
Ato: Aplicando aos nossos dias: quem está sendo excluído das igrejas, da
Oração, do convívio religioso e social, e do novo Povo de Deus? Não são os
pobres, os negros, certas mulheres, os afro-brasileiros, e o povo LBGTQ+?
4º
Ato: “Os seus Anjos nos céus veem sem cessar a face do meu Pai que está nos
céus” (Mt.18,11) Há um fundo histórico, sócio-cultural e religioso nesta
afirmação, como vimos no Talmude dos
Judeus. Nesta parte do evangelho todos esses tipos de pessoas, doidos, cegos,
surdos, mulheres, mudos, ficavam todos excluídos da sciedade e incluídos na
classe mais baixa que são as crianças. Então, em oposição a esse repúdio e
desprezo, aqui o evangelho garante que sim, que essas pessoas sem status e sem
estatuto social não só vão poder entrar na Sinagoga e no templo, mas que os
Anjos não se envergonham deles e nem fecham os olhos, e assim veem
constantemente a face do Pai que está nos céus. E por isso mesmo são os
preferidos de Deus numa ironia que os Anjos “não fecham os olhos” para não
enxergar Deus nem tais pessoas.
5º Ato: O homem das 100 ovelhas: “Que vos parece, continuou Jesus, se um homem tem 100 ovelhas e uma delas se perde, não deixará as 99 nas montanhas para procurar aquela que se perdeu? Se ele a encontrar ficará mais feliz com ela do que com as 99 que não se perderam”(v.13). A pergunta: quem é a ovelha que se “perdeu”? Justamente esses tipos de pessoas que eram excluídas da Sinagoga. Aí quem se perdeu significa “que vocês jogaram fora, marginalizaram e excluíram do reino de Deus e do Templo. A afirmação é a mesma: por isso são os preferidos de Deus, mais do que os “frequentadores do Templo, e da Sinagoga, com vaidades e preconceitos”. Aqueles que se “perderam” são aqueles que vocês jogaram fora. Infelizmente, com o andar do tempo desviou-se o sentido destas parábolas para um espiritualismo vazio muito individualista, tomando a “criança” no seu sentido biológico, e o “pecador” como a “ovelha perdida”, enquanto que não tem nada a ver com isso: o pecador é quem excluiu e afastou a ovelha. É evidente que, historicamente, à Igreja interessava este sentido “individualista” do espiritualismo “individual” em vez de olhar a realidade da exclusão e de tantas participações por conta de tantos preconceitos. São estas as “ovelhas perdidas”, i.é, expulsas, que é preciso ir atrás e dialogar sobre os motivos do afastamento e da marginalização, e do desprezo e do abandono. Antigamente a Sinagoga era madrasta. Em vez de acolher excluía. A Igreja de Cristo tem tido épocas de madrasta em vez de mãe. Eu acho que agora está na hora de ser mãe e não mais madrasta como antigamente, que era madrasta. Denunciando esta situação de madrasta, veja a declaração de SONIA GOMES, nos trabalhos que estão decorrendo no Sínodo: “É preciso ter o coração fraterno para o encontro com as mulheres que choram pelo caminho da crucificação diária, pois encontramos muitas mulheres que não tem acesso à Eucaristia, ao Batismo e catequese para os seus filhos, por conta de estruturas ainda duras, moralistas, que não conseguem sentir compaixão”, advertiu. Sônia é presidente do CNL, Conselho Nacional de Leigos do Brasil.
Conclusão.
Fizemos pietismo apequenado do termo “criança” e da “ovelha perdida”. Sem
avaliar o real sentido e a real lição histórica e teológica que está nestas
palavras.
P.Casimiro João smbn
www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br
Nenhum comentário:
Postar um comentário