Para os cristãos gregos a palavra
“Jesus” não dizia nada. E então associavam-na a um tal “chrestos” que era o
nome de um escravo lendário por ser muito bom, conforme o historiador Suetônio
(R.Scroggs, O Jesus do Povo, p.119). Em diálogo com os cristãos da Palestina é
que os gregos começaram associando Jesus à palavra Kyrios quando eles aclamavam
os deuses e as deusas ou o imperador, palavra que era “senhor” e kyrios. Por
outro lado, os gregos tinham a notícia de que na Palestina tinha andado um tal
Jesus que alguns judeus achavam que era um “político”-Messias. O tal Messias
era considerado “herdeiro do trono de Davi”, e teria vindo para ser um
governante político-militar. Mas as autoridades se desfizeram dele. Porém
outros, em maior número, o consideravam um religioso conhecido como filho do
homem, igual alguns profetas antigos. E assim essa história tinha chegado aos
ouvidos dos gregos. Na verdade os camponeses hebreus espoliados talvez não tivessem
esperança de que o Jesus governante político-militar fosse mais favorável à sua
sorte miserável que todos os governantes que vieram antes dele e aos quais
ainda estavam submetidos no presente. Pelo contrário aquele Jesus “curandeiro”
que tinha andado no meio do povo, a quem chamavam “Filho do Homem” era mais
popular e compatível com os camponeses. Neste sentido, é concebível que esta
crença fosse o fator mais forte que tornou o título “Messias” possível e
aceitável para os judeus, mas para os gregos, ao contrário, tanto “Filho do Homem”
como “Messias” não dizia muita coisa, pois não era da sua
cultura. Até porque nessa mesma época entre
os gregos havia uns sábios filósofos que faziam muitas curas e alguns também se
arrogavam o poder de ressuscitar pessoas mortas. Lembremos que não estamos
falando daquelas camadas que ainda tinham conhecido Jesus em pessoa, mas muitos
anos depois, quando Jesus já “tinha passado à história”. E nesta altura do
campeonato estamos lidando com cristãos descendentes de judeus e com cristãos descendentes de gregos. E por isso, para as camadas de cristãos judeus ainda lhes
interessava o “Jesus” terreno, mas para as camadas de cristãos gregos não. Para
estes interessava-lhes um Jesus glorioso e político e militar como eles estavam
acostumados com seus heróis. E desse jeito surge a falta de interesse no Jesus
terreno em toda a Igreja helenística porque esse Jesus glorioso e politico e
militar vinha como eles estavam acostumados. (Cf. o.c.p.125). Aí havia o culto com as “aclamações”
públicas que constavam de tipos de “slogans” repetidos vezes sem conta, em
ambiente público. Este tipo de culto e aclamações começaram a transferir para o
Jesus dos hebreus o mesmo que o “Kyrios” ou “Christos” era para os deuses e
deusas dos gregos. Estava consolidado o nome de “Kyrios”, e “Christos” entre os
gregos, nome que passou para toda a Igreja e para os escritos do Novo
Testamento, Cartas e evangelhos, que estavam começando a ser redigidos nessa
mesma época. As primeiras foram as Cartas, nos anos de 40-50 d.C. e depois os primeiros
evangelhos, anos 70-80 d.C. Temos uma notícia ainda antes de avançar. Vimos que
para os cristãos gregos a palavra “Jesus” não dizia nada no início. Mas junto
com a palavra “Kyrios” se popularizou também a palavra Christos, de “chrestos”
a lenda do escravo obediente. E foram estas duas palavras que ficaram
associadas à pessoa de Jesus. Então ficou o dueto “Christos Ýesus” ou o trio
“Kyrios Yesus Chritos”, “Senhor Jesus Cristo”. E foi assim que passou para os
escritos do Novo Testamento. Na verdade, como afirmam os estudiosos, o Novo
Testamento e a Igreja em geral ficaram devendo mais à língua e à cultura grega
do que à judaica. As Cartas paulinas e Atos dos Apóstolos são exemplos
flagrantes. Como falei em páginas anteriores, o autor de Atos pretendeu, em
Atos dos Apóstolos fazer um épico tomando por modelo a Eneida. Com o particular
que Atos e Evangelho de Lucas eram inicialmente um só volume, tendo ficado
separados somente no séc.V por vantagens de manejo. Já Paulo nalgumas Cartas
fica dependente da cultura grega, como quando fala em “todo o vosso ser, corpo, alma e espírito”,
seguindo o filósofo Posidônio que dizia que o espirito pertencia ao reino do
Sol, a alma ao reino da Lua, e o corpo ao reino da Terra, trazendo à baila
Plutarco que dizia: “o espaço entre o reino de Deus e o reino da humanidade é
ocupado por espíritos celestes, alguns com poderes divinos. A hierarquia desses
poderes divinos é uma escada desde o mundo humano até Deus” (H.Koester, o.c.p.
159 e 163). E na Carta aos Filipenses Paulo conecta o nome habitual grego dos
deuses e imperadores ao de Jesus dos hebreus com o nome de Kyrios como falámos.
E assim amplia na Carta aos Colossences 1,16 quando fala dos poderes celestes
que ocupam os espaço entre o reino de Deus e o reino da humanidade (Col. 1,16).
Em resumo, o teólogo R.Scroggs afirma: “
Para o autor de Atos Jesus era um ser humano que foi justificado por Deus e
voltaria no fim dos tempos. Para o autor de Colossences Jesus ressuscitou para
uma realidade divina “cósmica” ou “espacial”: Cristo é aqui o nome para a
realidade “espacial” exaltada de Deus: os fiéis estão em Cristo; morrem em
Cristo; ressuscitam em Cristo; estão escondidos em Cristo; Cristo é o mistério
de Deus; Cristo concede a paz; essa realidade também é Kyrios, mas o simples
nome de “Jesus” não se encaixa nessa realidade cósmica” (o.c.p.130-131).
Conclusão.
Concluindo, é preciso dizer que nós somos filhos da cultura judaica e da cultura grega. E tivemos ocasião de ver como evoluiu entre os primeiros cristãos gregos o nome de Jesus, e as associações que fizeram com os nomes de seus deuses e imperadores. Como consequência vimos também que o Jesus terreno não lhes interessava, pois nessa época aquele Jesus que "curava" o povo e era amigo do povo era uma figura que depois de 60 ou 80 anos "já tinha passado à história", esquecendo a figura humana de Jesus para ver só o Jesus mítico e cósmico. E assim esta situação passou para os novos escritos e para o "âmago" da Igreja em geral até hoje.
P.Casimiro João smbn
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