Era uma vez um coronel das terras do Oriente que, antes de viajar entregou 100 moedas de prata a dez colaboradores mais confiados do seu agronegócio e terceirizou a eles o trabalho de suas propriedades. Após suas férias e suas diversões e saciar sua sede de regalias pelas capitais da Europa, quando voltou convidou logo seus arrendatários para conferir os negócios e os lucros. Ao que mais lucrou confiou-lhe o governo de um quinto dos seus domínios territoriais, e ao segundo um décimo. A outro que decidiu não negociar deixou-o de mãos vazias, igual como estava antes. Porém, sobre os outros sete terceirizados o coronel não nos dá notícias. Mas isso não interessa ao narrador Lucas. (Lc. 19.11-23). Como é já um jargão, o evangelho não é geográfico e não é histórico, é teologia. E a lição moral ou teológica aqui qual será? A mesma da Carta aos Tessalonicenses, que estava sendo escrita pela mesma época. " Depois nós, os vivos, os que estamos ainda na terra, seremos arrebatados juntamente com eles sobre as nuvens ao encontro do Sehor nos ares"(1Tes.4,17). Os cristãos da 3ª geração ainda estavam no aguardo da vinda de Jesus com seus anjos, para levar os vivos ao seu encontro “nos ares”. Isso dava ocasião para que alguns não se dessem mais ao cuidado de trabalhar. Até que uma Carta posterior teve que corrigir essa visão dando o seguinte recado: “Não vos deixeis facilmente perturbar o espírito e alarmar-vos por palavras que afirmam estar iminente o dia do Senhor. Quem não quer trabalhar não deve comer”(2 Tes.3,10). Esta Carta foi escrita para corrigir o sufoco da espera do “dia do Senhor” de uns vinte anos atrás, E de onde afirmamos que neste evangelho também estavam na espera da vinda do “dia do Senhor”? Lá no início da parábola quando é falado assim: “Jesus estava perto de Jerusalém e eles pensavam que o “reino de Deus ia chegar logo.” (Lc.19,11). E qual a comparação ou paralelo entre a situação das comunidades da Carta citada e do evangelho? O seguinte: na Carta alguns não queriam trabalhar, e no evangelho esse terceiro empregado também não queria trabalhar. Após este preâmbulo histórico avancemos na exegese: Por conta das 100 moedas de prata e do “prêmio” acumulado, esta narrativa tem servido para os capitalistas da Europa e Américas para pensar a mesma coisa sobre Jesus, isto é, que ele apoiaria o lucro de quem já tinha mais, e para rotular de “preguiçoso” o terceiro funcionário, rotulado de “servo mau e preguiçoso”. E notamos ainda que a partir de análise do ambiente que explicamos da espera ou expectativa do final dos tempos, vemos que não tem sido esta a visão principal, e até de muitos comentadores. Porque será? Não haverá aí uma visão até inconsciente do valor do acúmulo? Poderíamos ver aí uma visão oposta, i.é, que da perspectiva camponesa os dois que lucraram mais para o coronel-patrão poderiam ser considerados como exploradores que cooperavam com o patrão em esquemas de opressão. Em segundo lugar notemos o seguinte: A possibilidade de esta parábola ter sido uma reflexão do evangelista está nos últimos versículos: “Enquanto a esses inimigos que não queriam que eu reinasse sobre eles, trazei-os aqui e matai-os na minha frente” (Lc.19,22). Era impossível aquele patrão ser a representação de Jesus ou de Deus como dá a entender o texto. É mais uma reflexão de como agiam os patrões daquele tempo visando o lucro. Além disso, é mais uma indicação literal de histórias imperiais elaboradas pelos redatores que marcaram atitudes na história da Igreja e da nobreza para fazer os mesmos procedimentos de “matar” e torturar, adotando os mesmos métodos do patrão-homem-nobre-e-rico. Temos um caso paralelo de como não era costume "agradecer" ao trabalhador ou funcionário. “Por ventura o patrão terá que agradecer ao servo porque fez o que lhe havia ordenado? (Lc.17,9). Somos convidados a ter prudência quanto à costumeira expressão de que a “Bíblia dizia”. Na verdade uma coisa é dizer a “Bíblia dizia” outra coisa é: a “Biblia diz”. Ou seja: a Bíblia dizia para aquela época muitas coisas sobretudo tendo em conta assuntos de costumes sociais e culturas ainda rudes e atrasadas e opressoras que não poderia dizer para hoje, como no caso referido onde a Bíblia “dizia” que não precisa “agradecer” ao trabalhador por ter feito o seu serviço. Enquanto que hoje todo patrão deve reconhecer o valor do funcionário e lhe ficar sempre grato. Porém naquela época não se agradecia ao funcionário ou trabalhador mas só se tratava com rigor e quem sabe na base do chicote, sem agradecimento nenhum. As palavras do Papa Francisco são atuais: “Nos bons relacionamentos não faltem as três palavras: “com licença, desculpe, obrigado”. Também entre patrões e funcionários.
P.Casimiro
João smbn

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