segunda-feira, 27 de novembro de 2023

Existe uma religião verdadeira?


 

No Cristianismo já se guerreou, se queimou e matou gente, se destruiu e assassinou, se falsearam documentos. Aí nos deparamos com esta pergunta: Houve coisa igual em outras religiões? Houve. No Cristianismo há gente santa? Há. Também há nas outras religiões? Há. Então a pergunta volta: haverá uma religião verdadeira ou haverá igualdade entre religiões? Junto com esta pergunta vai outra: Onde está a verdade? Vejamos: “Nenhum problema produziu na história das religiões tantas guerras como o problema da verdade. Em todos os tempos o fanatismo cego pela verdade atormentou, queimou, destruiu e assassinou impiedosamente. A consequência foi o cansaço da verdade, a desorientação e o abandono de toda religião” (H.Kung, Teologia a caminho, p.262). Para sair já de posições antipáticas, começo esta reflexão assim: No céu não haverá religiões, só uma, a do amor. Não existirá o Budismo, ou Hinduísmo, ou Islamismo, nem o Cristianismo. No final não existirá nenhuma religião, mas somente o próprio inefável ao qual se dirigem todas as religiões” (o.c.p.291). Esta é nossa premissa. Daí vamos deduzir várias verdades escondidas nesta caixa de Pandora ao contrário. A posição tradicional da Igreja era que apenas uma religião é verdadeira, todas as outras seriam falsas. Esta teologia foi preparada nos primeiros séculos por Orígenes, Cipriano e Agostinho, copiando do A.T. onde o Judaísmo funcionava como a única religião verdadeira. E isto foi definido depois pelo IV concílio de Latrão (1215), com o jargão “Fora da Igreja não há salvação”, e pelo concílio de Florença em 1442. Com a chegada das descobertas dos novos continentes a Igreja viu a fragilidade dessa teologia e procurou interpretar de forma nova esse dogma. “Roma entendeu de forma nova esse dogma absolutamente excludente, o que com frequência levou a uma reinterpretação e até transformá-lo em seu contrário” (o.c.p.266). Na verdade, como falei no Blog anterior, essa configuração da “salvação” já não servia para os tempos modernos que começaram com as descobertas. E assim se mostra que dogmas parece serem como camisas de força que com o tempo ou eles estouram ou estoura a pessoa. No concílio de Trento os teólogos Belarmino e Suarez reconheceram como suficiente para a salvação eterna um desejo inconsciente do batismo e de entrar na Igreja. E no séc.  XVII Roma condenou a proposição dos Jansenistas que era: “fora da Igreja nenhuma graça”. E no séc. XX, em 1964 o concilio vaticano II afirmou na Constituição sobre a Igreja: “Todos os que buscam a Deus sinceramente e procuram cumprir a sua vontade  conhecida por meio da consciência, e agem sob o influxo íntimo da graça podem obter a salvação” (L.G. n.16). E na Declaração sobre as religiões não cristãs: “A Igreja católica não rejeita o que é verdadeiro e santo em todas as religiões” (Nostra Aetate n.2). Como podemos ver, o dogma caiu por si mesmo como fruta passada e “fora de prazo” de validade.

Chegados neste ponto, os teólogos perguntam: então o “Cristianismo o que tem ainda para oferecer” E a questão é: se o anúncio cristão hoje, diferentemente de outras épocas, constata já não a pobreza  mas as riquezas das outras religiões, então o que o próprio Cristianismo  ainda pode oferecer? Como pode continuar oferecendo a “luz”, quando reconhece por toda a parte uma luz revelada? Se todas as religiões têm verdade, por que o Cristianismo seria a verdade? Se há salvação fora da Igreja, e do Cristianismo, o que ele tem a mais? (o.c.p.268). Antes de partir para outras reflexões, a resposta adequada será: o Cristianismo tem a oferecer a referência ao “humano”, ao autenticamente humano. Não adiantaria a multidão de ritos, de celebrações, de teologias e de orações, mas desprezando e negligenciando o ser humano. “Tudo o que quereis que os homens vos façam fazei-o vos também a eles, pois esta é a Lei e os profetas” (Mt.7,12). Porque se as outras religiões praticam isso e o Cristianismo não, o que poderia então oferecer? Não se pode apelar ao “divino” para destruir o “humano”. “Se uma religião pratica aquilo que é verdadeiramente humano, isso sim, pode invocar em seu favor a autoridade do “Sagrado” (o.c.p.274), pois o que há de mais “sagrado” é o ser humano, nem o “sábado”, nem os jejuns, sacrifícios ou orações.(Mc.2,28).

Chegamos a outro ponto onde topamos com outra constatação seguinte: As outras religiões têm virtudes e defeitos? Porém, há acusações contra o Cristianismo quando ele pensava ser a única religião verdadeira, justo como também o Judaísmo, o que depois achou que não era bem assim, quando se pensa na queima de “hereges” e na “venda de indulgências” em tempos idos. No critério de outras religiões o Cristianismo se apresenta ante as outras religiões com uma “consciência doentia do pecado” e da culpa, e de sua aversão contra o mundo e o corpo”, (o.c.p.273), deixando de lado o valor em si do “ser humano”, e de deixar de lado o “não faça aos outros o que não quer que façam a você mesmo”. Daí que a  verdadeira religião pode se identificar com a “bondade” ou a boa conduta, da seguinte forma: um cristão ou um budista “verdadeiro” é o cristão ou o budista “bom”. Nesse sentido a questão de qual é uma verdadeira ou falsa religião se identifica com a prática da bondade e do amor. Já dizia um cantor: “O amor é a melhor religião” (FranciscoMarinho@.com). Nesse sentido todas as religiões são iguais quando levam ao 1º e 2º mandamento do Sinai, que já não é um mandamento exclusivo mas patrimônio das religiões universais, (Mt.7,12).

Do que dissemos seguem-se alguns corolários: 1- O Cristianismo não tem nenhum monopólio da verdade, e tampouco o direito de renunciar ao testemunho da verdade que ele possui, como as outras religiões possuem as suas verdades. (L.G.16), precisando lidar com o binômio diálogo versus testemunho; 2- Depois do concílio vaticano II o teólogo Karl Rahner lapidou a frase que os fiéis sinceros das outras religiões são “cristãos anônimos”, para explicar o nº16 da Constituição sobre a Igreja, e o nº2 sobre as religiões que já aduzimos. Isso pôde ter servido para aquela época do concílio para dar o ponta pé inicial do inicio do novo jogo da teologia. Porém agora vemos que já não tem sentido uma vez que supõe uma situação de superioridade que considera de antemão a própria religião (a cristã) como a única verdadeira; e só por isso já exclui o diálogo antes mesmo de iniciá-lo. Devemos afirmar que os homens e mulheres de outras religiões devem ser respeitados como tais e não integrados ou colonizados numa camisa de força da teologia cristã. Ou seja, eles se conhecem como pertencendo e cumprindo a sua consciência e a sua religião pelo seu valor próprio e não com a “capa” de um anonimato que não existe e que esvaziaria o valor das suas crenças.

Conclusão. Poderá haver uma religião unificada para o mundo inteiro? Impossível, porque todos os caminhos bons levam a Deus. Na verdade, nenhuma religião possui toda a verdade. Apenas Deus possui a verdade plena. Só o próprio Deus, qualquer que seja o seu nome, é a verdade. No  fim da história não haverá religiões, só uma, a do amor. Já não existirá Budismo ou Hinduísmo, Islamismo ou Judaísmo ou Cristianismo. No final não existirá nenhuma religião. Nem profetas ou  iluminados como pontos de luz nos horizontes da humanidade: nem Maomé, nem Buda, nem o próprio Jesus Cristo que entregará tudo a Deus Pai (Jo.14,28).

P.Casimiro João     smbn

www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br

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