Aretologia era uma literatura greco-romana sobre pessoas em
que se tornava visível uma força divina, chamada areté, força, virtude e
valor fora do comum entre os humanos, de tal maneira que eles eram
classificados como “os divinos”. Isso deu origem a um tipo de literatura baseada
no cacife desses personagens, assim tipo axé dos afrodescendentes brasileiros da Bahia,
onde o axé é força, virtude
espiritual. Este gênero de escrita foi um gênero que campeou em círculos
cristãos da Igreja primitiva e se apoderou também da vida de Jesus, e mais
tarde continuou a comandar a escrita dos “Atos dos mártires” e “Vidas dos
Santos” como chegaram até nós hoje. Essa doutrina influenciou fortemente os
judeus da diáspora que depois se tornaram cristãos, como afirmam os
historiadores. Personalidades como Alexandre Magno e o imperador Augusto eram
considerados como “homens milagrosos e apelidados como “filhos de Deus”, os
“divinos”. No conceito popular eram seres celestes “revestidos de figura
terrestre que apareceram em nosso mundo, alguns vivendo tão virtuosamente,
muitas vezes renunciando a todo prazer, à carne e à sexualidade, e com tanta
força ou areté, que eram exorcistas e curavam doentes, às vezes
ressuscitavam mortos. O divino tornava-se visível em seu miraculoso
aparecimento terreno. Nasciam também miraculosamente do próprio Deus, muitas
vezes virginalmente, isto é, eram divinos. Depois da morte eram “arrebatados”,
tirados “dentre os humanos” e “assumidos” junto aos seres divinos e não
raramente apareciam depois a seus íntimos e “admiradores”. Os estudiosos
dizem que “judeus de língua grega,
educados com tais ideias, ao ouvirem falar sobre Jesus e ao se tornarem
cristãos, sentiam-se plenamente motivados para interpretarem Jesus neste formato
padrão helenista dessa aretologia. (Cf. E.Schillebeeckx, Jesus a história de um
Vivente, p.425). No evangelho de Marcos e de João foram usadas referências que
tiveram como fonte essa aretologia. Uma referência muito clara é a terminação
do evangelho de João onde diz: “Jesus realizou ante os olhos de seus
discípulos muitos outros sinais
que não estão escritos neste livro. Estes foram escritos para que creiam que
Jesus é o Cristo, o filho de Deus, e, crendo, tenham a vida em seu nome”
(Jo.21,25). Justamente era assim que terminava o final das vidas de todos
os miraculosos homens de Deus: “Poderíamos falar de muitas outras coisas e
nunca terminaríamos. Mas para concluir podemos dizer: “ele é tudo”. Como
poderíamos encontrar forças para elogiá-lo?” (Sr.43,27). E: “O restante
das ações dele, de seus combates, das proezas que realizou, de seus títulos de
glória, não foi escrito pois seria assunto demais” (1.Mc.9,22). Aretologias
e biografias de heróis se escreviam com finalidade propagandista. Lucas usa
frequente este recurso a fim de tornar seu evangelho mais “acessível” para os
gregos. Em lugares mais destacados, como o seu evangelho da infância de Jesus,
é apresentado como uma aretologia. E não
só: Os Atos dos Apóstolos continuam a mesma narrativa sobre os “grandes feitos”
dos apóstolos, como em At.2,22. (o.c.p.427). No Novo Testamento, a primeira
propaganda missionária pertence à aretologia, aumentando as listas de milagres
bem como os formatos de vocações e chamados para uma missão.
Conclusão. Numa de suas Cartas Paulo fala sobre missionários que têm
no bolso “cartas de recomendação”. Na realidade eram cartas onde alguma
comunidade atestava neles obras miraculosas, “aretológicas”, imitando os
grandes milagres de Jesus. Em resposta, Paulo declara que prega Jesus mas “sem
esses poderes, para não diminuir o valor da cruz de Cristo”. Por isso se refere
aos valores onde se baseava: “nos sofrimentos e nas perseguições por amor a
Cristo” (2Cor.4,7-12). Isto prova como essa aretologia influenciava
comunidades e cristãos. Tomara que hoje, passados tantos anos, ainda não
continue influenciando não só pregadores evangélicos, mas também católicos.
P.Casimiro João
smbn
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