sexta-feira, 22 de abril de 2016

A Pontifícia Comissão Bíblica e a interpretação do fundamentalismo e literalismo bíblico



Algumas vezes fiquei confuso quando ia procurar no evangelho de São João a narração da Ceia, e não encontrava. Tinha que ir noutro evangelho. No de São João, em vez da Ceia só tem o Lava-pés. E me perguntava, cadê a Ceia?

Agora comecei a entender o porquê. O serviço ao outro é outra Ceia e outra comunhão. Porque na Ceia os primeiros cristãos punham em comum as comidas, e na Ceia de São João os serviços. Na comunhão  se punham em união com Cristo, e na 
Ceia de São João nos pomos em união com os irmãos.

Na verdade, colocar as comidas em comum e comer o pão para se por em união com  o Cristo, mas não se pondo em união com os irmãos fica perigoso ou mentiroso. São Paulo quis dizer mesmo isso na 1ªcarta aos coríntios, cap. 11. Não praticando a caridade comiam e bebiam a própria condenação, numa expressão forte do próprio Paulo.

Quando Jesus ia entregar a sua vida na paixão, ele falou que com isso ele e o Pai seriam glorificados (Jo,13,31), veja bem que no mesmo contexto da narrativa da Ceia. Na verdade, no serviço ao irmão consiste a glória de Deus e o maior testemunho de comunhão.

Aliás, “quem come e bebe a própria condenação” não deve ser tomada à letra. Como se diz, muitos ditos igual esse traduzem uma opinião e um exagero de opinião do autor do texto, que não deve ser entendido literalmente, assim como dizemos hoje, por exemplo “vá pro inferno”.  Só entende à letra quem estiver na fase de entender a Bíblia no sentido do fundamentalismo  e literalismo. Como diz também o evangelho “ a letra mata, o espírito é que dá a vida” (Jo,6, 53),

A Pontifícia Comissão Bíblica em 1994 já alertou para esse perigo do fundamentalismo; “Ele, o fundamentalismo se recusa a admitir que a palavra de Deus inspirada foi expressa em linguagem humana e que foi gerida sob a inspiração divina por autores humanos cujas capacidades e recursos eram limitados. Por esta razão, ele tende a tratar o texto bíblico como se tivesse sido ditado palavra por palavra pelo Espírito, e não chega a reconhecer que a palavra de Deus foi formulada em uma linguagem e uma fraseologia condicionada por uma outra época.” 

E ainda: “O fundamentalismo tem igualmente tendência a uma grande estreiteza de visão, pois considera conforme à realidade uma antiga cosmovisão já ultrapassada, porque encontra-se expressa na bíblia”. (Pontifícia Comissão Bíblia “ A interpretação da Bíblia, Loyola, 1994, p. 40.41).

Aliás até o próprio cardeal Ratzinger em 1966 escreveu que um dos pontos culminantes do Conc. Vat.II era que “As formas e costumes litúrgicos que as formulações teológicas pensaram ter surgido com os Apóstolos pareciam produtos de processos complicados de conhecimento no seio da história” (Ratzinger, Paulist Press Deus Books p. 99).

“Quem comer este pão sem se importar com o seu irmão come e bebe sua própria condenação” ( Rede Vida, 11/04/16)
A comunhão não é um fim, é um meio. É o meio para se unir e servir melhor o irmão. Se não for assim vale para pouco. Tem gente que vive só para comungar, mas tem menos gente que comunga para servir e trabalhar.


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