Algumas vezes fiquei
confuso quando ia procurar no evangelho de São João a narração da Ceia, e não
encontrava. Tinha que ir noutro evangelho. No de São João, em vez da Ceia só
tem o Lava-pés. E me perguntava, cadê a Ceia?
Agora comecei a
entender o porquê. O serviço ao outro é outra Ceia e outra comunhão. Porque na
Ceia os primeiros cristãos punham em comum as comidas, e na Ceia de São João os
serviços. Na comunhão se punham em união
com Cristo, e na
Ceia de São João nos pomos em união com os irmãos.
Na verdade, colocar as
comidas em comum e comer o pão para se por em união com o Cristo, mas não se pondo em união com os
irmãos fica perigoso ou mentiroso. São Paulo quis dizer mesmo isso na 1ªcarta
aos coríntios, cap. 11. Não praticando a caridade comiam e bebiam a própria
condenação, numa expressão forte do próprio Paulo.
Quando Jesus ia
entregar a sua vida na paixão, ele falou que com isso ele e o Pai seriam
glorificados (Jo,13,31), veja bem que no mesmo contexto da narrativa da Ceia.
Na verdade, no serviço ao irmão consiste a glória de Deus e o maior testemunho
de comunhão.
Aliás, “quem come e
bebe a própria condenação” não deve ser tomada à letra. Como se diz, muitos
ditos igual esse traduzem uma opinião e um exagero de opinião do autor do
texto, que não deve ser entendido literalmente, assim como dizemos hoje, por
exemplo “vá pro inferno”. Só entende à letra quem estiver na fase de
entender a Bíblia no sentido do fundamentalismo e literalismo. Como diz também o
evangelho “ a letra mata, o espírito é
que dá a vida” (Jo,6, 53),
A Pontifícia Comissão
Bíblica em 1994 já alertou para esse perigo do fundamentalismo; “Ele, o fundamentalismo se recusa a admitir
que a palavra de Deus inspirada foi expressa em linguagem humana e que foi
gerida sob a inspiração divina por autores humanos cujas capacidades e recursos
eram limitados. Por esta razão, ele tende a tratar o texto bíblico como se
tivesse sido ditado palavra por palavra pelo Espírito, e não chega a reconhecer
que a palavra de Deus foi formulada em uma linguagem e uma fraseologia
condicionada por uma outra época.”
E ainda: “O fundamentalismo tem igualmente tendência a
uma grande estreiteza de visão, pois considera conforme à realidade uma antiga
cosmovisão já ultrapassada, porque encontra-se expressa na bíblia”.
(Pontifícia Comissão Bíblia “ A interpretação da Bíblia, Loyola, 1994, p.
40.41).
Aliás até o próprio
cardeal Ratzinger em 1966 escreveu que um dos pontos culminantes do Conc.
Vat.II era que “As formas e costumes litúrgicos que as formulações teológicas
pensaram ter surgido com os Apóstolos pareciam produtos de processos
complicados de conhecimento no seio da história” (Ratzinger, Paulist Press Deus
Books p. 99).
“Quem comer este pão
sem se importar com o seu irmão come e bebe sua própria condenação” ( Rede
Vida, 11/04/16)
A comunhão não é um
fim, é um meio. É o meio para se unir e servir melhor o irmão. Se não for assim
vale para pouco. Tem gente que vive só para comungar, mas tem menos gente que
comunga para servir e trabalhar.
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