segunda-feira, 6 de março de 2023

Quaresma, glória e fome.

“Pedras podem transformar-se em pães”? (Mt.4,3) Sim, as pedras do povo se transformam em riqueza e muito pão para outros que têm cargos de governo nas nações. O povo tem muitas pedras e muitos espinhos na sua vida. “No meio do caminho havia uma pedra” (Drumomond de Andrade).  Parafraseando podemos dizer que no meio do caminho dos pobres não há somente uma pedra mas muitas pedras e muitos espinhos dolorosos. Nestes casos a fragilidade de uns é glória de outros. Fala-se muito em estupros de vulneráveis. Sim, aqui quem é vulnerável é a nação, e muitos governantes estupram a nação e o povo. Desde 2014 que as autoridades das cidades costeiras do Brasil (Baixada Santista) foram avisadas dos riscos de deslizamentos e nada fizeram. Em Petrópolis, autoridades ficaram com os recursos destinados aos atingidos pelos deslizamentos de 2021 conforme afirmado pelos canais televisivos. Dois dias antes dos deslizamentos da Vila Sahy de São Sebastião, os prefeitos foram avisados, porém nada fizeram, e deixaram o Carnaval correr, mas em vez do carnaval quem correu foram as águas que mataram 74.

Em segundo lugar, para nos colocarmos no início da quaresma, seria possível Jesus “subir na parte mais alta do Templo para se jogar” (Mt.4,5). Reflexão: O analfabetismo geral se transforma em domínio fácil para alguns, e ainda mais usando a religião para seus fins perniciosos. Temos outra derivante que encerra a parábola das “tentações de Jesus”: No cimo de uma montanha foram oferecidos a Jesus “todos os reinos do mundo e sua glória se ele adorasse o demônio” (Mt.4,8). Na verdade muitas pessoas, levadas pelas ganâncias e por muitas alienações facilmente se entregam nas mãos de políticos habilidosos, gananciosos e perversos para adorá-los. Eles até podem dizer assim: “esse deus que vocês adoram não lhes dá nada mas eu darei tudo que vocês precisam”. Eles pretendem que sejam adorados pelo povo.

No outro lado da medalha, uma oração da quaresma fala assim: “que a Igreja e seus ministros não cedam à tentação do poder, da glória e da riqueza”. Não será que a Igreja terá contribuído muito para que em vez do povo adorar a Deus, adore as pessoas, achando que por uma roupona vistosa são adorados, e pela riqueza, e pela glória, e pelo poder, igualmente como os políticos? Os fariseus receberam uma advertência de Jesus quando lhes disse: “ vocês trazem largos filactérios e estendem largas franjas nos seus mantos, e amam os primeiros lugares nos banquetes e as primeiras cadeiras nas sinagogas” (Mt.23,5).

Na verdade, a Igreja está no patamar dos poderes políticos, no outro lado da medalha, por todas as vezes que as pessoas do mando usam roupas vistosas, poder, glória e riqueza. E em vez de servir, se oprime o povo. Porque a riqueza dá poder, as rouponas dão poder, e com o poder vem a glória. Em contrapartida, há uma oração rezada todos os dias, que diz assim: “não nos deixeis cair em tentação”. No entanto, quanto mais se reza essa oração todos os dias, mais se busca a riqueza, mais se buscam roupas vistosas, mais se busca glória e mais se busca poder. Em todos os níveis da Igreja. Aliás nós sabemos que as vestes da Igreja são uma herança do Império romano. Quando o império romano acabou passou para a Igreja em honrarias, roupagens, brasões e títulos. O poder do imperador passou para o Papa, e como imperador o Papa dizia “eu mando em todos e ninguém manda em mim” (Inocêncio XIII), e o título de “príncipe” passou para os bispos, como “príncipes da Igreja” e o Papa como o “rei dos reis” (www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br de 24/10/21).

Ainda está aí um caso bastante escondido que conta o seguinte: No encerramento do concílio Vaticano II houve uma resolução para que fosse vendida a Tiara de três coroas de ouro usada pelo Papa, e de fato Paulo VI vendeu-a para entregar o dinheiro aos pobres da rua da cidade de Roma e começou usando uma tiara mais simples e sem ouros. Ótimo que foi bom. Porém, dali a pouco mais de 20 anos um dos sucessores, em 2009, Bento XVI lembrou que nos baús antigos do Vaticano havia uma Tiara ainda mais rica, da época dos imperadores e cheia de ouro, conseguiu essa coroa e começou usando, igual a outra vendida. (Hans Kung, “A Igreja tem salvação?”, p.228).

Hoje em dia há alguns candidatos ao seminário que quando voltam à sua cidade depois de um ano no seminário da diocese de Frederico Westphalen (RS) regressam com vestes clericais semelhantes a cardeais. A xarada é que um paroquiano deu o seguinte comentário: “Como? Aquele menino saindo há pouco dos cueiros e já vem vestido de cardeal?”

Conclusão. Há uma oração dos cristãos que reza assim: “o pão nosso de cada dia nos dai hoje”. Hoje quem tem a barriga cheia diz que quem cobra pão para os pobres é comunista. Porque não querem que ninguém mexa com eles. Na época de Jesus chamavam a Jesus de belzebu, e que tinha belzebu; porque ainda não havia esse termo de comunista. Na verdade, quem não tem pão não tem poder. Muito menos riqueza, glória e vestes de grife. A Igreja e o Estado, quem sabe, poderão achar que o pão para os pobres é um favor, mas para eles é um direito. E é sempre bom lembrar a invectiva de Jesus: “Ai de vós fariseus hipócritas que trazeis largos filactérios e largas franjas nos vossos mantos, e amais os primeiros lugares nos banquetes e as primeiras cadeiras nas sinagogas” (Mt.23,5).

P.Casimiro João       smbn

www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br

 

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