domingo, 17 de outubro de 2021

“Vende tudo o que tens, dá aos pobres, e terás um tesouro no céu”(Mt.19,21). Argumento bíblico e econômico de uma proposta igualitária.


 Em primeiro lugar, o homem em questão foi provocado a fazer um ato de justiça. Porquê? Pelo argumento bíblico do ano jubilar. “O ano do jubileu, sete períodos de sete anos somando 49 anos. Esse ano será santo. É um tempo de se proclamar a liberdade através da terra para todos os que se tornaram escravos por causa de dívidas, e em que serão canceladas todas as dívidas públicas ou privadas. É um ano em que todas as propriedades familiares tornarão aos seus proprietários originais ou aos seus herdeiros; Devem respeitar o vosso Des e nunca praticar a opressão”(Lev.25,9-10.17).

Vale dizer, o ano do jubileu era uma instituição para equilibrar a justiça que tinha sido descumprida nos sete vezes sete anos em que os ricos donos de terras foram extorquindo as pequenas propriedades e até a casa dos pobres que tiveram de entrega-las à força por não ter com que pagar as suas dívidas. Desde aí, o pobre ficava sem a possibilidade de produzir a sua comida diária. E o rico aumentando a sua riqueza diária com o acúmulo de terras que extorquia dos pobres.

Passados os sete anos, quantos bens de produção o rico proprietário ajuntava, e de quantos bens de produção o pobre se privava? Isto é, a riqueza de um aumentando, e a pobreza do outro aumentando também. Daí podemos dizer que a riqueza do rico fabricava a pobreza do pobre. Vinha o ano jubilar para dar um certo equilíbrio. O que era do pobre retornava para ele. Mas quantas porcentagens a mais que tinha colocado na mão do rico, além das contas que lhe devia, durante os 49 anos? E com quantos mais bens o rico proprietário tinha-se locupletado durantes os 49  anos? Acontece um porém: é que a lei do ano jubilar ninguém a cumpria, segundo os estudiosos (Jhon Bright, (História de Israel,316).

Não custa então tirar uma ilação de que esse senhor “muito rico” estava sendo provocado a fazer um ato de justiça: devolvendo alguma coisa das contas que tinha aumentado em tantos anos com as terras de pobres. E em outros casos surgia a escravidão. Em quantos casos, em vez de ficar com as terras que não tinha, o dono rico ficava dom o pobre como escravo. (Lv.25,40). Escravidão que foi aceita na Bíblia, e no povo judeu, como nos tempos infinitos do cristianismo até os séculos da Idade Moderna. A qual foi ainda sacralizada pelo malfadado fundamentalismo religioso dos cristãos da América do Norte, com o falso argumento de que Cristo estaria chegando e com ele o fim das coisas, e não se podia mexer com os pobres e escravos porque estávamos no fim. Achavam que tinham por seu lado as Cartas de Paulo onde ele declarava :”Quando for dado o sinal, à voz do arcanjo e ao som da trombeta de Deus, o mesmo Senhor descerá do céu...e seremos arrebatados juntamente com eles sobre as nuvens ao encontro do Senhor.”(1 Tes.1).

O evangelho de Mateus encerrou a cena do seguinte modo:”O homem foi embora cheio de tristeza porque era “muito rico” (Mt.19,22). Vale dizer, o homem não aceitou o desafio do equilíbrio. Os estudiosos traduzem o ”jovem ricopor “homem ambicioso ou ganancioso, igual `aqueles que se compraziam em aumentar suas posses defraudando os pobres arranjando maneiras de ficar com as posses deles. (Cf. B.Malina e R. Rohrbangh, p.115).

Veja bem, esse movimento do fundamentalismo de que falei é que foi o fermento para a rejeição em massa da teologia da Libertação, que a partir daí influenciou o Vaticano e respingou na América Latina. E foi uma bandeira do Presidente Ronald Reigan dos Estados Unidos da época para implantar o Regime da ditadura militar no Brasil em 1964 distribuindo dólares aos generais, senadores e deputados para implementarem a ditadura e treinado os torturadores na América do Norte. (Cf.A teologia da Libertação e o regime da ditadura miliar no Brasil, BLOG www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br /20200).

Depois deste argumento bíblico, podemos ver o argumento econômico do crescimento do rico e do declínio do pobre. É só ver como vive o assalariado, o operário, e o homem da agricultura familiar. Estes vivem e gastam diariamente o que ganham diariamente. E o agricultor gasta suas colheitas diárias em cada dia. O homem de salário não multiplica; o que recebe gasta. O agricultor não multiplica, o que colhe gasta. E vivem só comprando porque nada têm para vender, mas só comprar. O proprietário rico vive só de vender e aumentando em cada dia, semana e mês. Quantos mais compram, mais ele vende e mais lucra. Resultado, este aumenta, os outros ou ficam no que estão ou diminuem. E se vem a inflação, só cai em cima dos pobres, porque os proprietários e comerciantes e Firmas aumentam os preços. Porém o salário não aumenta. Então a inflação favorece sempre quem vende e prejudica sempre quem compra.  No caso do homem rico, ele se beneficiava por dois motivos: pela produção das suas propriedades, e pela venda nos seus comércios.

Não nos admira então o encerramento da cena com a advertência de como a ganância é frequentemente grande obstáculo para pertencer ao reino dos céus. Como entrar “pelo buraco de uma agulha”(Mt.19,24). Ao que responde o evangelho com o ditado popular da época que “para os homens é impossível, mas para Deus tudo é possível”(Jer.32,17). Claro que nem para Deus seria possível alguém entrar num buraco de agulha, mas o imaginário popular até isso inventa.

Conclusão. O reino de Deus que Jesus anunciou é um reino onde “Deus manda”. E onde Deus manda não tem ganhadores nem perdedores, mas onde todos são ganhadores. É como numa família, todo mundo aumenta o lucro da casa, e todos crescem no gasto e no consumo. Por isso aqui adéqua o conselho “se queres ser perfeito, partilha tudo que é teu porque tudo é de todos, e terás o tesouro que é a tua família, o teu reino, que é o reino de teu pai, onde tu és um filho.”

P.Casimiro João    smbn

www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br

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