domingo, 9 de janeiro de 2022

Religião madura não é dogmática, aceita os desafios e corre os riscos da busca.

Hoje em dia os historiadores deram-se conta que alguns dogmas foram proclamados por motivos de viés político e por motivações até pessoais inconfessáveis. Isto deu-se em épocas de conflito e de não aceitação por parte da Igreja de filosofias que depois vingaram no mundo e que a própria Igreja acabou aceitando.

Aí se invocavam até motivações “divinas” para esse endurecimento da religião. O mesmo endurecimento se viu debilitado com o andar  dos anos. Foi assim  que o Papa Pio VI invocava uma suposta“revelação divina” para condenar a filosofia dos direitos humanos, a liberdade de religião, e a liberdade de consciência, em 1791. É por isso que afirmam os teólogos que os dogmas traduzem épocas e histórias discutíveis. E traduzem na verdade uma fé da Igreja ainda não madura, que na época “não aceitava desafios e  os riscos da busca”, como afirma Mário Aletti, docente da Universidade Católica de Milão.(citado por Ales Bello, “Entre  Fenomenologia, Psicologia, e Psicopatologia” Paulus, p.160).

Podemos citar o ambiente histórico de Pio IX (1792-1878) que viveu a época da perda dos Estados Pontifícios. Podemos imaginar a crise emocional com que teve que conviver e que o levou a proclamar tantas condenações e a ainda mais à obstinação de lançar mão de todos os meios para proclamar a infalibilidade pontifícia, que era a última coisa que lhe restava para satisfazer o Ego, que ele via ser destruído por todos os lados como uma estátua que se vê derrubada de seu pedestal.   Enfrentando as filosofias do Modernismo, Iluminismo, e Liberalismo publicou o documento Syllabus que “enumerou” quase 100 erros da sociedade, e os condenava com o apelido de “a peste do mundo moderno”. Com isso ele declarava “guerra à modernidade“ e ajudou a debandada de cientistas e filósofos católicos e muitos intelectuais. Estava criado um ambiente em que a Igreja não era considerada nem escutada. Dali a uns anos, em 1950, o Vaticano não foi nem admitido a tomar parte na Convenção Europeia para os Direitos Humanos.  Essa crise do Papa atingiu o seu pique ao  convocar o Concílio Vaticano I em cujo encerramento tinha um propósito da proclamação da Infalibilidade papal. A história diz que não conseguiu a maioria dos Padres Conciliares, e teria resolvido o caso por meio de ameaças a uns e de privilégios a outros, fato que levou vários Padres conciliares a abandonar o Conclave.(Cf. H.Kung “A Igreja tem salvação”, Paulus, 166).

Já vimos que ele não aceitava as mudanças da modernidade que “eram a peste do mundo moderno”, e filosofias que defendiam a liberdade de religião e de consciência, como também as teorias que defendiam que o poder dos reis devia estar livre da tutela da Igreja, e os que defendiam a independência da razão, o liberalismo. Para nossa surpresa, hoje tudo isto faz parte da filosofia e da doutrina da Igreja, como confirmou mais à frente o Concílio Vaticano II (1960-64).

Para explicar fatos como estes, valemo-nos dos estudos dos psicólogos da religião. Estes psicólogos, como W.Allport, o fundador da psicologia da religião, e A.Vergote distinguem uma religiosidade “extrínseca” e uma religiosidade “intrínseca”. (A.Bello o.c.p.160). A religiosidade extrínseca diz respeito a uma necessidade de segurança, de conforto, de defesa. A religiosidade intrínseca reconhece que a fé é um valor que se traduz num empenho pelos outros e procura meios para fazer os outros e a sociedade crescerem para o objetivo maior que é o reino de Deus. A primeira olha para o seu reino, o seu umbigo; a segunda visa o reino de Deus, que é também o reino dos outros.

A religião intrínseca é alimentada por um processo de formação permanente capaz de conduzir à maturidade religiosa. A religião extrínseca parou no tempo. Acha que não há mais nada para aprender, que já sabe tudo. A religião intrínseca move-se naquela consciência própria do ser humano que sabe que nada está acabado, mas tudo por acabar, é a consciência darwuiniana do não acabado.

É por isso que Freud falava do infantilismo da religião, quando o ser humano só fabrica ilusões que governam a sua vida, como um plasma gravado na sua infância e que distorce as realidades da vida adulta. Esse plasma é uma camisa de forças que não deixa crescer. E depois dele, entre outros como Sartre e Nietzshe.

O que nos permite concluir desta situação é que a infantilidade da fé de muitos adultos é que provoca a incredulidade de muitos “ateus”. Ou seja, a religiosidade  do medo, do conforto e da defesa que não cresce. Que nunca chega a olhar o mundo e a própria fé com olhos de adulto. Seria como se um menino do Pré e do jardim de infância permanecesse assim no meio de adultos, doutores, cientistas, e professores ou gente com ensino médio, filosófico, e humanístico. No caso ele iria gritar que os outros estão todos errados e só ele está certo. Ou então se recolher e conviver só com seus parceiros do início da escolaridade e do tempo das fadas.

Conclusão. Falei que a Igreja teve seus problemas com os dogmas. Não será por isso que hoje em dia, como vem acontecendo depois do Concílio Vaticano II, a Igreja católica se tornou mais acolhedora e compreensiva e aberta às outras religiões? E não só, também para com os Sem fé, e sem religião? Na verdade, um princípio norteou os Padres do Concílio Vaticano II: de não publicar dogmas e nem excomunhões de jeito nenhum para nada e para ninguém.

P.Casimiro  João   smbn

www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br

 

 

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