segunda-feira, 13 de fevereiro de 2023

Casamento como moeda de troca: um histórico do percurso da instituição familiar.

Na antiguidade e no A.T. os casamentos funcionavam como ferramentas de manutenção de relacionamentos entre grupos sociais e como moeda de troca para aumentar as propriedades dos mais ricos. Muitos casamentos eram desfeitos conforme alguns dos pais achavam vantagem para aumentar suas propriedades com a troca de esposas. Assim, um casamento era considerado como meio de manutenção do poder econômico.(W.Carter, evangelho de Mateus, 476). Na continuação da história, isto funcionava na Europa durante toda a Idade Média, para fazer alianças políticas e militares entre reis, príncipes, e demais membros da nobreza. E também para a celebração do casamento continuavam o mesmo ritual de Antigo Testamento.

Durante a Idade Média, como no A.T. o matrimônio era evento familiar e civil antes de ser religioso, e era realizado quando o noivo tivesse a sua casa pronta. A cerimônia era realizada na casa dos pais do noivo. Os pais e os familiares mais próximos acompanhavam os noivos até o quarto. Depois despiam-nos, abençoavam-nos, e deixavam-nos sozinhos e todos iam para um banquete.(Malina e R.Bohrbaugh, Sinóticos, 113). Depois da cerimônia o marido era o “patrão” da sua esposa. Ela passava a ser propriedade do marido, e só tinha a função de reproduzir filhos, e se não tivesse dava-se logo o divórcio ou a poligamia. Por isso havia os preconceitos contra o sexo que não fosse reprodutivo, como atos solitários e homossexualidade, que apesar da proibição na Bíblia ela existia, como vem aí: “A alma de Jónata se ligou com a alma de Davi; e Jónata o amou como à sua própria alma. Jónata tirou todas as suas roupas, entregou-as a Davi e se deitou com ele. E inclinando-se três vezes beijaram-se um ao outro” (1 Sam.18,1-3; 20,41). Assim como entre duas mulheres Noemi e Rute, onde se diz: “Aonde quer que tu fores eu irei, e onde quer que tu pousares ali pousarei eu; onde que que morreres eu morrerei e ali serei sepultada”. É significativo que a pena de morte para o adultério se aplicava só à esposa, e nunca ao marido. E por qualquer coisa, não importa o quê, como perda de beleza, doença, embriaguez ou discussão com a sogra. Aliás, já nos povos vizinhos também havia a pena de morte, não era só nos judeus. O imperador Augusto e tantos outros a plicaram, e porquê? Sempre contra a mulher. Vejamos: adultério significava “ir contra a honra de um homem tendo relações sexuais com a sua esposa” (Malina o.c.p.113). Daí que o adultério então era só em relação à mulher, o oposto não se dava. Era um desafio à honra do homem é que estava em questão.

Depois dessa época alguns chefes de famílias começaram a convidar o padre da igreja para essa cerimônia da bênção dos noivos. E daí é que pouco a pouco a celebração passou para a alçada da igreja. O caráter irrevogável, como no Antigo Testamento, dependia dos interesses dos grupos envolvidos no contrato. Inclusive, para os nobres a dissolução do matrimônio dependia de decisões parlamentares, que decretavam ou não a quebra do matrimônio. E o consentimento? O consentimento só começou a fazer parte da tradição a partir do séc.XII com o Decreto da Graciano. E foi só no séc.XII em diante que o casamento ficou sob a alçada da Igreja. É por isso que o matrimônio só foi declarado sacramento no séc.XII. Antes não era sacramento. E somente a partir do séc.XIX, em 1836 que o casamento se tornou civil quando foi documentalmente assumido pelo Estado, e religioso quando assumido pela Igreja.

A família do A.T. incluía o esposo, suas esposas e seus filhos, suas concubinas e seus filhos, os filhos casados, as noras, os netos, os escravos de ambos os sexos e seus filhos sob o mesmo teto.(Cf. Gn,14,14). Ter muitos filhos era a maior necessidade para trabalhar a terra que era a principal ocupação dessa época, além de aumentar homens para as guerras. Ainda vem a propósito o conceito da Igreja na Idade Média sobre a moral do matrimônio: Apesar de necessário o sexo no matrimônio continuava sendo pecado para muitos sacerdotes e moralistas; e devia limitar-se somente à reprodução que não estava livre do estigma de pecado, sendo severamente proibido todo erotismo e jogos sexuais. (www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br 20/11/22).

Como vimos, ao longo de toda a história da espécie humana diversas foram as configurações assumidas pelos agrupamentos familiares, segundo as culturas, e visões de mundo e concepções teológicas. (No Brasil o adultério era considerado crime antes de 1940, com reclusão dos culpados. Só em 2005 ficou isento, pela Lei 11.106).  A família é algo de direito natural inscrito na condição humana, de toda a forma que possa ser vivida. Não é supérflua a reflexão que só no séc. XIII lentamente entrou dentro dos interesses da Igreja. Vem ao nosso propósito a seguinte reflexão de Rita C.Rodrigues: “Ainda que as religiões cristãs sejam majoritárias em nosso país não podemos nos esquecer que estamos  num país laico e democrático, regime que não se deixa regular pela primazia dos interesses da maioria sobre os da minoria. No Brasil a liberdade de culto, e inclusive a de não ter nenhum credo é direito constitucionalmente assegurado. Desta forma resulta inválido invocar argumentação de caráter religioso para tratar institutos de natureza civil. Tratar dessa forma  histórica e dogmática as questões da vida civil, penso que não contribui para melhorar o entendimento entre os segmentos em debate” (Rodrigues, Rita, (“Jus.com.br”). Por tudo que fica dito a família é uma instituição de direito natural. Isto quer dizer que não é só a Igreja que tem o direito de legislar sobre o matrimônio mas também o Estado.

Conclusão. Atendendo ao histórico do matrimônio desde o A.T. entre os Judeus e passando por toda a Idade Média, e tendo em conta os preconceitos da Igreja sobre o sexo e de quebra sobre o matrimônio, fica válida a nossa avaliação da possibilidade de bastante suspeição a respeito de muitos eclesiásticos em seus pronunciamentos sobre matrimônio, família, sexo e até atenuantes de julgamentos abortivos. Ainda mais quando esses assuntos são proferidos exclusivamente por homens, sempre os homens falando em nome das mulheres, e ainda mais, homens solteirões, e nunca  dando oportunidade e chance a mulheres mais esclarecidas e científicas em casos onde a mulher é a principal acionista. A suspeição aí pode chegar aos 100% por cento.

P.Casimiro João     smb  www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br

 

 

Nenhum comentário: