segunda-feira, 10 de junho de 2024

ONIPOTÊNCIA E CRUELDADE.


 

Os povos primitivos viviam da caça e da pesca, e paulatinamente foram aprendendo a tirar da terra o sustento  para acrescentar a essa atividade primeira. Nascia assim a agricultura. Quando os grandes agricultores e proprietários de terras resolveram se agregar para defender os seus interesses e aumentar suas posses, decidiram formar as cidades, onde construíram seus comércios e armazéns. Não só, mas cuidaram de aumentar seus servidores a troco de subornos e donativos baratos. E quando emprestavam dinheiro ou terras para outros trabalhadores, arrebatavam as poucas propriedades deles como pagamento. Nas cidades formaram-se centros de controle e policiamento para defender esta classe de pessoas abastadas, e centros de mando e de poder. Em outras palavras, a onipotência era o valor focal das cidades desde a sua fundação. Estudiosos modernos sugerem que a crueldade é um processo de mutilar. A mutilação não é só física mas mais ainda moral: enganar o cidadão com a ignorância, tirar-lhe o direito de falar, de reclamar e de se expressar. É a violência institucionalizada. E nas antigas cidades, como Roma, faziam-se festas para celebrar esta mutilação, no Coliseu, com lutas ferozes de fortes contra fracos, ou feras devorando os vencidos. Chama-se a isto que a onipotência anda junto com a crueldade. O rei era grande quando mostrava que podia tudo e não encontrava opositores iguais a ele. “Os romanos, como os mediterrâneos em geral, incluindo Israel, eram inclinados à violência e crueldade, consequentemente desejando se empenhar no conflito físico ao mínimo sinal de provocação” (Bruce J.Molina, o evangelho social de Jesus, p.45). E essa era a qualidade que também  atribuíam a Deus exigindo sacrifícios e crueldade extrema contra os inimigos. Esta era uma sociedade violenta, com frequência violência pública e explosiva. O mundo mediterrâneo era um mundo violento e a tradição israelita sacralizava tal violência, o que se reflete nos sacrifícios que pensavam que Deus exigia, às vezes dos seus próprios filhos, tanto como de animais. “Eles ofereceram seus próprios filhos e filhas como sacrifício a deuses pagãos. Mataram aquelas crianças inocentes, os seus próprios filhos e filhas, como sacrifício aos ídolos de Canaã. E o País se tornou impuro por causa desse sangue” (Sal 106,37-39). Este comportamento violento aplicava-se também pela família aos seus membros, pela multidão aos concidadãos ou estrangeiros, pelas autoridades aos opositores. Um resumo do que fica dito se concretiza no mito da torre de Babel (Gn.cap.11), que sintetizava o conceito  de onipotência e crueldade. Na verdade, a etiologia da torre de Babel era a luta contra a construção das cidades. As primitivas tribos viviam do pastoreio e conviviam numa confederação de tribos onde ninguém era maior do que ninguém e olhavam a fundação da cidade como ameaça, por causa da acumulação de riquezas e da crueldade subsequente. Quanto a cidade é mais poderosa ela se mostra mais cruel, quanto mais onipotência mais crueldade. Essa constatação foi transferida para Deus. Na antiguidade o rei era o filho dos deuses que tudo podiam e sabiam. Daí que o rei era o princípio do poder e da sabedoria como os deuses. Na entronização do filho do rei se faziam grandes festas onde ele era entronizado e aclamado como o filho de Deus. Logo logo ele era o deus, com poder de morte e de vida sobre os mortais. A obediência cega e sem limites ao rei ficou coisa sagrada. Assim nasceram as teocracias que foram os primeiros sistemas de governo no mundo, “o governo sagrado de Deus” que tudo pode e tudo manda, e onde a onipotência anda junta com a crueldade: Logo, a teocracia e ditadura eram a mesma coisa. Com a agravante que a ditadura era em nome de Deus. Essa onipotência e essa ditadura da crueldade automaticamente passaram para o rei, que se arrogava, como deus, poder de vida e de morte sobre os cidadãos. Quanto mais cruel, mais poderoso se achava o rei, o que levou um filósofo a dizer: “A crueldade é um dos prazeres mais antigos da humanidade” (Fredrich Nietzsche).

Conclusão. Hoje em dia constatamos  a sobrevivência desse sistema antigo e obsoleto nas ideologias modernas das diversas ditaduras. Ideologia das extremas direitas que revivem um passado mofado, fora da época de validade que mata as cabeças, envenenando-as como quem engole  um remédio passado de prazo que causa morte. Veneno que entra em cabeças tanto de religiosos como de políticos que exercendo influência e sendo eles manipulados pelo deus do dinheiro Mamón envenenam e manipulam por sua vez consciências e cabeças até à exaustão.

P.Casimiro João     smbn

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