domingo, 22 de agosto de 2021

Aceitar Moisés ou aceitar Jesus? Um dilema necessário no Novo Testamento da autoria de Paulo, que originou o “eu aceitei Jesus” de agora.


 

Aceitar a Lei, ou aceitar Jesus? Eis a questão. Aceitar Moisés ou o cristianismo? O ícone da Lei era Moisés, e o ícone de Moisés era a Lei. Moisés e a Lei era a salvação. Agora Jesus é a salvação. Na consciência de todo Antigo Testamento estava internalizado que fora de Moisés não há salvação; fora da Lei não há salvação; e fora dos mandamentos e decretos. Ora, pelos anos 50 depois de Cristo levanta-se um homem declarando: “Ele, Jesus, aboliu a Lei com seus mandamentos e decretos” (Ef.2,15).

Este era o Paulo, que então fez uma tempestade na segurança que era o Antigo Testamento, como que fazendo-o ruir pelas bases. Ele colocou nessa Carta o aporte bem visível de uma FAIXA que estava no “MURO DE SEPARAÇÃO”do Templo de Jerusalém. De um lado os pagãos, do outro lado os Judeus. Ali o judeu separava-se do pagão e o pagão não tinha acesso ao Templo sob pena de morte. Aquilo era o ícone da separação dos seguidores de Moisés, da Torá, da Lei, e da Aliança. A separação dos salvos, e dos condenados. Dos eleitos e dos proscritos. Dos puros e dos impuros. Levantar a voz contra isso soaria igual à blasfêmia com que Jesus foi condenado à morte: “Destruam este templo, e eu o reerguerei um três dias” (Jo.2,19).

E Paulo fez isso. Sem olhar as consequências, escreveu: “Do que era dividido, Jesus fez uma unidade; em sua carne ele destruiu o muro de separação. Aboliu a Lei com seus mandamentos e decretos”(Ef.2,14-16). Isto é, com a sua teologia, Paulo encostava os Judeus contra a parede e não só os judeus mas os cristãos-judeus que tinham-se convertido e continuavam a frequentar a Sinagoga e continuavam no cumprimento da lei da circuncisão, e dos decretos do sábado, e do puro e do impuro, e das refeições separadas, e das carnes imoladas. O dilema era o seguinte Aceitar a Lei e o Moisés da Lei, ou aceitar Jesus?

Continuando em sua pregação ele dizia: “Deus quis reconciliar judeus e pagãos num só corpo por meio da cruz, destruindo em si mesmo a separação”(Ef.2,16).  O que tinha em mente era que quem continuasse a aceitar Moisés não daria valor nenhum à cruz de Jesus. Tornava inútil a cruz de Cristo. “na verdade, se a justiça se obtém pela Lei, Cristo morreu em vão”(Gál.2,1).

A isto inclui-se a teologia fundante de Paulo, que inclui a pergunta: de onde vem a salvação? Para o Antigo Testamento vinha da aceitação e da prática da Lei ou Torá, e dos Mandamentos, mas agora com o novo evento, a salvação vem de Jesus Cristo. Continuando a questão: de onde vem a salvação para o crente? O crente já está salvo pelo sangue de Jesus; o judeu ainda espera a salvação pelo cumprimento da Lei e pelas obras. A salvação que vinha para o judeu, da Lei, agora vem para todos pela fé, justificados pela graciosa benevolência de Deus, isto é, pela Graça. A justificação não vem pela Lei, mas pela fé. Não mais por Moisés, mas por Jesus.

Este tema de Paulo, foi muito bem captado pela Reforma do séc.XVI. O dilema necessário, aceitar Moisés ou Jesus, aceitar a salvação pela Lei ou pela graça? Eis a questão. Muito claro que a Lei tinha sido dada aos Judeus, porém a graça, e o agraciamento é dado para todos que aceitarem Jesus. E por isso mesmo já não é a carne e o sangue que fazem a descendência de Abraão, mas a graça e a fé que fazem a nova descendência de Abraão. E isto pelo fato de Abraão não ser justificado pelas obras mas pela fé, pelo  que Abraão é chamado o Pai dos crentes Ora, se sois de Cristo, então sois verdadeiramente a descendência de Abraão, herdeiros segundo a promessa”(Gál.3,29).  Daí que o judeu que continuava na aceitação de Moisés e da Lei estaria tornando inútil a cruz de Cristo.

Note-se que o cumprimento da Lei exigia o pagamento de salário como justiça. Logo o judeu cumpridor se considerava justo pelas obras, e credor diante de Deus. E com direito a “desprezar” os “não cumpridores”,”maldita toda a pessoa que não puser em prática as palavras da Lei”(Dt.27,26). Em contrapartida, quem aceita Jesus e a salvação da cruz aceita um dom gratuito, uma graça, sem reclamar salário: “Porque é gratuitamente que fostes salvos mediante a fé”(Ef.2,8). Como dito atrás, na teologia de Paulo, o crente já está salvo pelo sangue de Cristo; o judeu ainda espera a salvação pelas obras.

Conclusão. É evidente que Paulo manejava dois argumentos: o de Abraão e o da cruz.  Para aqueles que se consideravam descendência de Abraão segundo a carne, Paulo opunha a descendência de Abraão  segundo a fé: “os filhos da promessa é que serão considerados como descendentes”(Rom.9,8). Para aqueles que se consideravam ser povo eleito pela Aliança e a Torá, Lei do Sinai, Paulo contrapõe a cruz de Cristo que derribou o muro da separação pelo sangue de Cristo. E de dois povos fez um só “homem novo”, onde “não há judeu nem grego”,(Gál.3,28).

Na época moderna tomou corpo a expressão “eu aceitei Jesus” que retoma a mesma teologia pelas igrejas da Reforma, e foi buscar as suas raízes na mesma teologia paulina. A Igreja católica foi pega de calça curta, e de ambos os lados houve excomunhões. Os tempos agora são outros. Chegou neste espaço de tempo a Declaração Universal dos Direitos Humanos, e com eles a Liberdade de consciência, a Crítica científica e Histórica e a Crítica bíblica e o novo espaço do Ecumenismo. Em 31 de Outubro de 1999 foi assinada a “DECLARAÇÃO CONJUNTA ENTRE AS IGREJAS LUTERANAS E A IGREJA CATÓLICA” sobre a doutrina da Justificação, em Augsburgo. Hoje em dia é fácil ouvir das crianças da catequese, “eu aceito Jesus” e “eu estou salvo” igual as crianças das igrejas evangélicas. Eu tenho a certeza de que, se fosse agora, não haveria excomunhão mas diálogo inteligente e fraterno.

      

P.Casimiro João    smbn

www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br

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