Na
página anterior tivemos alguma referência à história de Salomão e apresentámos
as referências de Mark Smith que “apesar
de não ser considerada historicamente inútil, a Bíblia não ocupa mais o lugar
privilegiado de ditar as normas para a reconstrução do passado de Israel. O
testemunho bíblico é “considerado” e “pesado” com evidências arqueológicas e
textos extrabiblicos depois de terem sido avaliados separadamente por seu valor
histórico” (Mark Smith “O memorial de Deus”, p.35). O assunto hoje é a
historicidade das narrativas salomônicas e, de quebra, de Davi.
Primeiramente, nenhuma construção de
Salomão foi encontrada em Jerusalém, como o famoso Templo de Jerusalém.
Pelo contrário, achados arqueológicos de grandes construções foram
achados na Samaria, e em Meguido, onde nunca andou Salomão, e de uma
data mais de 100 depois dele. Porém a Bíblia desvia os locais e os autores das
construções, atribuindo-as a Salomão, em Judá, no Sul, por motivos
políticos que veremos em seguida.(Cf. J. Ademar Kaeffer, A Bíblia e a
Arqueologia, Paulus, 2018, p.57-58). “Em Jerusalém não
há vestígios de construções que a Bíblia atribui a Salomão. Nem uma
pedra dessa estrutura foi encontrada, apesar de mais de um século de buscas por
conexões entre o texto bíblico e as evidências do local de escavações.
Essas construções contadas pela Bíblia, afinal de contas são da época da
dinastia omrida, dos reis do Norte: Omri e Acab, no Norte e
não na Jerusalém de Salomão.”(o.c.p.68). O motivo foi a ideologia dos
escritores do Sul que quiseram passar uma borracha na historia do Norte.
O templo de Jerusalém só na época
de Josias é que começou a funcionar depois da construção
subsidiada com o dinheiro da Assíria quando conquistou o país, para com
isso manter o domínio sobre Judá que prometeu boa convivência
e vassalagem de tributos a Nabucopalasser e Nabucodonosor
II da Assíria. Esta será
então a época do Primeiro Templo.
Foi nesta época que teve início a maior atividade
literária, que antes constava só de ensaios. Foi assim que a literatura deuteronomista
feita no Sul reeditou a história bíblica segundo a
sua ótica ideológica. E conseguiu isso aproveitando-se do declínio do
Israel Norte (Samaria) tomada por Sargão II e Nabucopalassar. Foi
assim que trocou os dados da história, forjando a ideologia do império
de Salomão. Depois os
assírios resolveram também abocanhar Judá e Jerusalém,
quando Judá quis trair a confiança da Assíria, aliando-se
secretamente com o rei Necau do Egito. Como tinha sido o fim da Samaria,
no Norte em 722, assim foi o fim de Judá, no Sul em 586. Falámos no inicio do período da escrita.
Ele começou na Samaria, Norte. Inscrições hebraicas aparecem pela
primeira vez em Hazor e Betsã em 883 na
Samaria (Norte), enquanto que no Sul só no século seguinte. E porque é
que essa escrita prosperou no Sul, em Judá?
Porque alguns fugitivos da
Samaria, quando foi tomada por Nabucodonosor, conseguiram fugir para Judá e
levaram consigo esses primeiros escritos, que depois foram transformados pela
ideologia do Sul. Temos na cabeça que Davi conquistou Jerusalém em 1.000
a.C. e depois teria sido sucedido por Salomão e daí por diante. Porém, as
últimas descobertas e escavações arqueológicas têm mudado a visão que é a
seguinte: 1- A formação de Estado da Samaria, Norte não tem nada a ver com os
filhos de Salomão depois do ano 1.000 a.C. mas com a dinastia Omrida (Omri e
Acab (884-831). 2- Como se formou o Israel bíblico: No séc.VIII
(722 a.C.) deu-se a queda de Samaria, Norte, e houve uma migração em massa para
Judá e Jerusalém: gente vinda da Samaria, de Betel etc. Jerusalém que tinha
1.000 habitantes ficou com cerca de 15.000 almas. Judá transformou-se em Reino
neste momento. A Assíria tinha aniquilado a Samaria porque era perigosa, mas
Judá não oferecia perigo nenhum. Foi com esta vinda para Judá que se formou
o Novo Estado de Israel bíblico. Não
há evidências claras da estadia de Israel no Egito nem em
fontes e documentos egípcios, nem na arqueologia. (M.Smit, O memorial de
Deus,p.176-177).
A escrita tomou agora seu grande momento. E foi
reformulada e reeditada toda a história de Israel, sob a ótica dos escribas do
Sul. O grande objetivo foi promover os “reis davídicos” como os únicos
governantes legítimos, e o Templo de Jerusalém, que de um quase nada foi
construído por Dário e os sucessores de Nabucodonosor, como dissemos, para
servir à ideologia da Assíria. O que levou pouco tempo, só até 586 quando se
deu a queda de Jerusalém e Judá. “O autor de Êxodo incorporou as tradições do
Norte mas as sujeitou aos seus principais objetivos ideológicos. Por isso foi
necessário a imaginação épica da construção do império
salomônico para dar todo o respaldo aos seus objetivos. Por isso é uma
história não bem contada na Bíblia, pois é ideologicamente distorcida, a fim de
servir aos interesses de Judá num momento em que o reino da Samaria já não
existia mais. Isto até que chegasse o momento em que Judá deixou também de não
existir mais. 586 a.C. (Cf.o.c.p.91).
Do lado da arqueologia fica evidente que os monumentos
tradicionalmente atribuídos a Salomão fazem parte da lenda. Como
vimos, em população e em relevância, Judá era desconhecida dos reis do entorno.
Nesse primeiro momento Judá não era ainda reconhecida como Estado. Foi devido a
isso que a ideologia posterior de Judá elaborou outros dois
mitos, Jeroboão e Roboão como filhos de Salomão para daí construir um Salomão
fabuloso e de quebra o mesmo Davi, os quais historicamente teriam sido apenas
simples chefes tribais. Nos registros da época não se encontram noticias de
Salomão nem do seu reinado. “Salomão não é mencionado em nenhum texto
extrabíblico nem do Egito nem da Mesopotâmia” (J.Ademar Kaeffer, o.c.p.56).
Conclusão.
A história bíblica é muito intrincada. Este pequeno resumo possa servir para
nos alertar sobre as nossas seguranças e nos levar a desconfiar de nossas
certezas.
P. Casimiro
João smbn
www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br
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