segunda-feira, 6 de maio de 2024

TEOLOGIA BÍBLICA, AS CRENÇAS QUE SE FORAM MISTURANDO COM A FÉ.


 

“Colocar o foco da vida cristã na crença e não na fé é simplesmente um equívoco. Fomos induzidos a isso por muitos séculos por teólogos que ensinavam que a fé consiste em crer diligentemente nos artigos ditados em alguns credos incontáveis que eles teceram” (Harvey Cox, O futuro da fé, pag.32). Todas as religiões e culturas são respostas ao mesmo mistério fundamental, mas cada uma responde a ele de sua maneira (o.c.p.38). Para os cientistas, a fé é o “mistério” Não se extasiar com isso é como ser velas apagadas (Einstein). Os seres humanos podem ser definidos como criaturas que perguntam ou criaturas teimosas que não conseguem parar de perguntar”porquê”?; e depois perguntam porque  perguntam “porquê?” (o.c.p.43).

Os humanos são os únicos que enterravam os seus mortos. Em algum momento da evolução, nossos antepassados perceberam que um dia morreriam, e isso aprofundou o mistério. Por mais avançados que fossem os outros animais, só os humanos marcavam os lugares onde colocavam os restos de seus mortos, de inicio apenas com uma pequena pilha de pedras. Eles já estavam tentando extrair sentido do mistério, e era isso que os distinguia dos outros animais. A percepção da própria mortalidade levanta a questão do sentido da vida, e isso acabou dando origem à filosofia, à religião e à cultura. Não se encher dessa admiração seria regredir a um estado pré-humano. Esmoreceríamos até virar velas apagadas. Poderíamos dizer, é melhor parar de perguntar. Mas porque ninguém pára? Aqui surge a religião na evolução da humanidade. Os mitos da criação, como o épico de Gilgamesh, a história da criação dos astecas, os primeiros capítulos do Gênesis não foram primariamente compostos para responder às perguntas sobre “como” e “quando”. Eles são perguntas e não respostas. Surge a pergunta se Jesus tinha fé. Temos que distinguir entre a fé em Jesus e a fé de Jesus. A fé de Jesus não era a fé ou não, da existência de Deus, porque essa fé já nasce com todo ser humano, mas a fé de Jesus é que nos interessa, e qual era? Era sobre recuos e perdas que pareciam às vezes malograr a vinda do Reino de Deus; as dificuldades não eram então de ordem intelectual, mas sobre os percalços da atividade e da sua vinda. As histórias da ressurreição significam que a vida de Jesus e o projeto que buscava não pereceram na crucificação mas continuaram na vida daqueles que continuaram  o que ele começou (Cf.H.Cox o.c.p.75).

Vem a propósito falar de crenças. Falamos em tentativas de encurralar a fé dentro de Kits. A esses kits ou pacotes podemos chamá-los de crenças, a que já nos referimos no blog anterior. Os primeiros desses pacotes de crenças nos inicios do cristianismo se basearam na suposta “autoridade apostólica”. E ela começou com uma aventura de Clemente de Roma. Pela história a gente sabe que entre Roma e Corinto existia uma animosidade sobre a atividade de São Paulo. Então numa ocasião foram eleitos elementos mais novos nas comunidades de Corinto, coisa que os mais idosos não aceitavam para não perder o “status” do mando. E Clemente de Roma antes de ser Papa mandou uma mensagem que, segundo o costume dos exércitos romanos, a razão é sempre dos mais velhos. Foi nisso que ele se inspirou para enviar essa mensagem. A “autoridade apostólica” portanto não vem do primitivo cristianismo, mas é um sofisma adventício posterior” (H.Koester e James Robinson, grandes historiadores da Igreja. (Cf. o.c.p.125). O problema era continuar o “status quo”. Este foi um dos pacotes iniciais que se fizeram crença. Nessa hora as prerrogativas do bispo de Roma não estavam ainda definidas. Igualmente aconteceram coisas curiosas  nesta época. E um outro pacote aconteceu: O mesmo Clemente de Roma teria forjado uma carta como tendo sido a ele direcionada por Pedro para ele ocupar o cargo de sucessor de Pedro. O nome de Clemente também aparece na lista das “Falsas Decretais”, aparecidas no séc.VIII. Mas tem mais: Como Clemente, Santo Irineu entrou noutra briga  sobre quantos evangelhos seriam admitidos no cânon do Novo Testamento. Irineu, que era bispo de Lião, impôs que fossem quatro, pelos seguintes motivos: porque foram quatro os quatro rostos da visão de Ezequiel: um rosto de homem; um rosto de leão; uma cabeça de águia, e uma cabeça de touro. E ganhou a disputa. (Cf. o.c.p.128). Aumentou o pacote de crenças. Outra coisa curiosa foi que “em algum momento do séc.III apareceu um documento chamado “Didascália apostolorum”. Divulgou-se que teria sido escrito pelos apóstolos, o que hoje os estudiosos declaram que foi uma grande armação. Até se dá um poder quase semidivino aos bispos, até que eles teriam recebido de Deus, como reis, o poder sobre a vida e a morte (Compenhausen,p.240), o.c.p.132. Isto estaria bem distante de Jesus lavando os pés de seus discípulos. Na verdade, depois de Diocleciano, o mesmo imperador Constantino ficou conectado  com a estrutura do Império Romano de modo autocrático, com Constantino reivindicando para si a mesma relação próxima com o Deus cristão que Diocleciano tinha com Júpiter. (Williams, 1997,p.206). O mesmo Constantino combinou com o bispo Nicolau de Nicomédia, o ritual  com a simbologia e com tudo que rodeava a monarquia e deveria enfatizar a sua origem divina. Ele só foi batizado na hora da morte. E concedeu a mesma autoridade e as mesmas insígnias aos bispos como tinham os sacerdotes de Júpiter. Estas lendas tiveram fácil entrada no cristianismo, o que podemos chamar de crenças. Por último, vejamos outra lenda que ficou famosa na Igreja. O imperador Constantino um dia contou que viu no céu uma longa lança com uma barra transversal, e nela escritas as palavras “com este sinal, conquiste”, quando estava em guerra contra seu irmão Maxêncio, para suceder no trono de Diocleciano. Daí se formou a lenda visionária para "loucos ouvirem”. Constantino continuou adorando tanto TIQUE, a deusa da sorte, quanto HÉLIO, deus do Sol, e nunca foi batizado, só o batizaram na hora da morte. E as outras religiões continuaram ao mesmo tempo que a de Jesus” (o.c.p138). A “conversão” dele foi estratégia para ser o novo gurú do Deus do cristianismo, como Diocleciano tinha sido o sacerdote máximo e guru do deus Júpiter do império romano. Tanto assim que foi ele que convocou o primeiro concílio da Igreja, e não os bispos, em 325, o concílio de Niceia, no seu próprio palácio de Niceia, rodeado de soldados com lanças brilhantes  onde, no meio deles se atribuía a si mesmo o poder como “sumo sacerdote e administrador” da Igreja (o.c.p. 140-144). Resta-nos dizer que as “visões” dele não passam de “contos de trancoso” e foram motivações políticas para se apoderar dos poderes da Igreja e unir o império que com Diocleciano estava se esfacelando. Entraram e fazem parte de mais um pacote das crenças primitivas. Essa visão será semelhante àquela visão do “fundamentalismo americano” quando em 1920 um tal pastor Dwight Moody imaginou ter visto o Senhor Jesus lhe revelando: “Moody, simplesmente leve o máximo de gente que conseguir para esse ‘bote salva-vidas”. (o.c.p. 198). E, como Constantino financiou a Igreja de Roma, agora o governo americano financiava esse fundamentalismo, que se espalhou por toda a América Latina, e que servia tanto para os pastores evangélicos  como para a ideologia dos governos da extrema direita que incrustou nos governos de Trump nos Estados Unidos, dos Malafaia-Bolso do Brasil e dos Milei da Argentina como dos Pinochet do Chile. Esses fenômenos hoje são chamados  “pareidolia”, isto é, a ação psicológica de “enxergar imagens fabricadas pela mente como imagens nas nuvens do céu, ou na lua “a cabra misteriosa”; ou a “cara de urso” em Marte ou a forma de gato do robô Perseverance, ou “as aranhas em Marte”.

Conclusão. Todo este pacote de crenças deu origem à tão desastrada política da “cruz e a espada” que acompanhou a Igreja em toda Idade Média e mormente nos descobrimentos onde acompanhou os impérios coloniais e deu também origem ao malfadado “padroado”, convênio dos reis com o Papa, e como na “Inquisição”. Desde o seu palácio de Niceia ele, o visionário Constantino deixou para a Igreja a marca de imperadora. Para as diversas colonizações dos países colonizados a triste pompa da Igreja como imperadora e os povos como colonizados. Desde o concílio vaticano I houve coisas que foram aprovadas na marra e com ameaças e “compra de votos”. Se usarmos um bom filtro, na nossa fé, muitas coisas aparecerão como crenças e não como fé. Exemplo, Joana d’Arch foi condenada como herege em 1431 e no séc. XX declarada como santa. (o.c.p.197). E isto é o menos, pois há muito pela frente de coisas escondidas, como já fizemos referência neste blog sobre a “armação” dos Estados do Vaticano. (Cf.www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br) de 8/11/20).

P.Casimiro João    smbn        

 

 

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