“Bem aventurados os pobres em espírito
porque deles é o reino dos céus”(Mt.5,3).
Há pobre que é pobre mas tem espírito
de rico. E por outro lado pode haver rico com espírito de pobre. O que
significa espirito de rico? Quais as manifestações? Em três, pela seguinte
ordem: primeiro, ganância; segundo, desejo de acumular, e terceiro,
desprezo pelo pobre. E como será o rico com espírito de pobre? Em três
dimensões: primeiro, entender o pobre; segundo colaborar para que o pobre fique
menos pobre; e terceiro, trabalhar pela justiça social.
Tentemos analisar cada um destes itens,
começando pela ganância que caracteriza o ser do rico: A ganância
é prima do desejo de ajuntar e acumular sempre mais, sem nunca saciar. E a luta
para acumular vai usar de meios lícitos e ilícitos, até mentir, defraudar, e
até matar o opositor. Fiar-se no que já tem para conseguir o que não tem, com
atividades preventivas e planejadas com advogados e parceiros de crime. E,
claro, a consequência é o terceiro item que é o desprezo e o deboche pelo
pobre; este espirito dá valor ao ter, e não à pessoa. Quem tem
dinheiro vale, quem não tem não vale.
Por outro lado, vem o rico com espírito
de pobre quando o rico tem empatia para com o pobre e entende e se dói com o
pobre. É um primeiro passo. O segundo passo é fazer ações para que o pobre
fique menos pobre e consiga chances de mudar para melhor. O terceiro passo é
trabalhar pela justiça social, se colocando ao lado de movimentos, projetos e
políticas que promovam mais igualdade entre as classes sociais.
O prêmio apontado no evangelho em
referência, é que o espírito de pobre herdará o reino dos céus. O evangelho de
João nos dá um palpite sobre o reino dos céus. “Na casa do meu Pai há muitas
moradas, e vou preparar um lugar para vocês” (Jo.14,3). Na verdade Deus bem
quereria que nesta vida cada um tivesse já a sua morada. Mas como Deus
terceirizou o mando deste mundo, acontece que quem tem o mando se apodera do
melhor ou de tudo, deixando tanto cidadão sem uma morada. Aí vem a ideia sempre
viva no Antigo Testamento da escatologia que Deus irá recolocar tudo no seu lugar
com o nome “reino dos céus”. Ali, no final dos tempos, Deus assume o
poder, e dará a cada um a sua morada. Acabando com a terceirização e má
distribuição.
Na casa do Pai, ou “reino do Pai”
haverá moradas. E sabemos que neste mundo não ter morada significa não ter
trabalho porque não tem estudo; não tem estudo, não tem dinheiro; não tem
dinheiro não tem o que comer; não tem o que comer e onde morar, por isso vai
morar na rua; morar na rua é ficar doente; e morrer cedo e não incomodar mais a
sociedade.
O jornalista e professor Douglas Gavras
põe esta questão: Porque é que nos últimos anos a “direita” se fortaleceu em
larga escala? E ele parte da análise de dados como o monopólio do acesso
escolar que tem sido sequestrado pelas elites. “Se duas pessoas terminam o
Fundamental ou o Médio, as oportunidades de trabalho vão para os da elite,
sempre brancos ou amarelos, enquanto que os mesmos diplomados pretos, indígenas
e pardos ficam sobrando”. Sendo assim, com o mesmo grau de instrução, 10% por
cento no topo ganham mais do que todos os outros. A elite econômica captou 65%
dos ganhos no nível Fundamental e Médio, e 30% para o superior”(Douglas Gavras).
E continua: “O esgotamento dos ganhos educacionais é uma das principais razões
do diminuição de democracia, e, por consequência, da ascensão da “direita”. Os dados sugerem que os brasileiros de menos renda ganham no
mercado de trabalho, mesmo que tenham igual ou mais estudo. Por isso as elites
fazem tudo para limitar o acesso ao estudo para que as demais faixas da
população não tenham acesso.” E, como dizia o ministro da Educação em 2022,
Milton Ribeiro, que fez o “Gabinete paralelo” no governo, com seus pastores
evangélicos: “Pobre não pode ser doutor”. Além de que entre mulheres e
homens, a renda do trabalho, ainda que com os mesmos diplomas, eles recebem de
150% a 50% a mais do que elas. Isto pertence aos direitos de gênero, estabelecido
pela CONSTITUIÇÃO brasileira no art.126, mas certos governos odiavam o conceito
e o estudo de gênero nas escolas, para ficar longe desses direitos.
Este é o “reino da terceirizado”
daqui debaixo que pouco a pouco tem que ser desmontado. Contrariamente à
opinião do Antigo Testamento que só aguardavam para o final dos tempos. A
Constituição brasileira diz que todos são iguais perante a Lei, no art.V. E no
art.126 trata do gênero afirmando os mesmos direitos sociais e políticos para
gênero masculino e feminino e outros. Mas num País que tem se negado a estudar
nas Escolas o conceito de gênero, como poderia cobrá-lo para o cumprimento da
Constituição?
Conclusão.
Esta reflexão deve-nos levar à convicção de que as Bem-aventuranças, embora
tenham muito do pensamento escatológico judaico, não são receita de “ópio do
povo” ou tentativa de anestesia perante os desmandos da sociedade, mas apelam
para “uma parceria entre Deus e aqueles que vivem de acordo com os propósitos
de Deus” (Warren Carter, evangelho de Mateus, p.183), enquanto aguardam o “império
dos céus” e a utopia possível do governo de Deus, que é também a utopia do governo
do povo (democracia). A tarefa dos pobres é lutar para frear a ganância dos
mais ricos, e para frear os desmandos da sociedade.
P.Casimiro João smbn www.paroquiadechapadinha.blogspot.com.br
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